Segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde, mais de 12 milhões de pessoas estão recuperadas da Covid-19 no Brasil. No entanto, conforme estudos da Secretaria Municipal de Saúde do Estado de São Paulo, 40% das pessoas recuperadas apresentam sequelas prolongadas.
Em São Paulo, de 17 mil pacientes que ficaram internados em hospitais municipais do estado, aproximadamente 42% foram acompanhados no período pós infecção. O percentual está próximo dos estudos realizados pelo Hospital de Clínicas, sobre pacientes com sequelas. De 1,5 mil internados nos hospitais, os especialistas projetam entre 30 e 40% com sequelas.
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“Os Estados e municípios ainda não começaram a se organizar para o atendimento pós-Covid”, salienta a psicóloga clínica e coordenadora dos atendimentos psicológicos do Projeto Com.Vida, Luciana Deutscher. Segundo ela, o atendimento pós infecção é de extrema importância para que o paciente retome com a sua vida – pessoal e profissional, e numa grande parte dos pacientes que necessitam de internamento, as sequelas psicológicas são muito frequentes, não apenas para o paciente quanto para os familiares. “Todos que atendemos até agora no Projeto Com.Vida, 100% deles solicitaram o atendimento de apoio psicológico para si mesmo e 80% dessas famílias tiveram apoio psicológico também para um ou mais familiares”, alerta Luciana.
É o caso da técnica em enfermagem Dyellen dos Santos Nogueira, que ficou internada durante 68 dias, necessitando de intubação e retornou a ser internada após alta, devido à pneumonia. “O apoio psicológico ao paciente de Covid é fundamental, seja paciente assintomático ou grave, como eu fui”, alerta. “O medo da doença se torna muito maior quando recebemos o resultado positivo em mãos. Me recordo diariamente do desespero da positivação e mais ainda, quando a médica me orientou a internar”, relembra. Segundo Dyellen é um misto de desespero e tentar organizar a rotina, de longe, e sem forças. “Ao ser internada, ainda não estava em quadro grave, e o desespero bateu por saber que havia deixado meu filho sozinho em casa”, recorda.
Para Dyelen, passar por toda a rotina de UTI, ser intubada, não saber se retorna, se vai conseguir vencer a doença, mexe muito com os sentimentos. “Ficamos desorientados”, reforça. “Quando tive o acolhimento psicológico, consegui enfrentar o pânico que desenvolvi. Mesmo trabalhando em hospital, eu não conseguia pensar em retornar à minha rotina. E como necessitei de reposição de magnésio, devido a uma lesão renal, precisava repor a medicação no ambiente hospitalar. E era cercado de pavor esse momento”, pontua.
Hoje, com todas as sessões de apoio, Dyelen aos poucos vem retomando a rotina. “Ainda não voltei a trabalhar, mas hoje consigo sair de casa, consigo caminhar na rua. E a cada crise de ansiedade, a psicóloga me atende, conversa me orienta. E esse acolhimento é essencial”, salienta.
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Para Luciana, as crises de ansiedade e de pânico estão muito ligadas com os pacientes pós-Covid. “Até pouco tempo, acreditávamos que era uma sequela daqueles que necessitavam de internamento e possuíam casos mais graves. Hoje, percebemos que as sequelas psicológicas estão presentes desde os casos assintomáticos, dos leves e graves e também muito frequente na família do paciente, mesmo não tendo se infectado”, alerta.
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p class=”ql-align-center”>Luciana Deutscher (Foto: Valterci Santos)
Para o atendimento do paciente pós-Covid, Luciana explica que é realizado a modalidade de orientação, acompanhamento e apoio psicológico. “É um processo que tem início, meio e fim, com duração de sessenta dias, onde é conversado sobre as necessidades que o paciente vem tendo com a recuperação, os medos e anseios. É uma sessão que atua como apoio emocional, onde são trabalhadas as sequelas emocionais, as dúvidas e incertezas”, explica.
“Com o apoio, o paciente consegue se recuperar mais rapidamente para enfrentar o tratamento das demais sequelas físicas, neurológicas e motoras”, reforça Luciana. Segundo a psicóloga, há uma mudança significativa na vida do paciente com Covid. “O comportamento, os gostos e as atividade, muitas vezes são rompidas devido à doença. Temos pacientes que não retomam na mesma atividade profissional, até mesmo devido as limitações impostas pela doença”, afirma. “Trabalhar esse momento emocional é um divisor importante para a recuperação total da Covid”, alerta Luciana.
Dyelen que ainda se recupera da Covid diz que, como paciente, precisa ter muita fé e acreditar que é possível vencer. “Não podemos desistir, porque não é fácil nenhuma das fases do tratamento. Não é fácil nem confortável você não conseguir respirar. É puxar o ar e não ter o ar entrando nos pulmões. É desesperador”, finaliza.
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