Os reflexos e balanços da pandemia da covid-19 vão muito além do aumento da ocupação das UTIs e serão sentidos pelas instituições e profissionais de saúde por muito tempo. A gravidade dos casos atendidos fez subir consideravelmente a necessidade de procedimentos de alta complexidade. No Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba (PR), com a necessidade da ECMO (Oxigenação por Membrana Extracorpórea), que funciona como um pulmão e um coração artificiais, o crescimento foi de impactantes 900%. Considerado o último suspiro de pacientes, a ECMO costumava ser indicada para dois pacientes por ano antes da pandemia. Mas só desde março de 2021, já foram 20. Este foi um exemplo de como a pandemia gerou aumento nos procedimentos de alta complexidade.
“Os hospitais vivenciaram uma explosão de procedimentos que demandam alta tecnologia e custo, e as equipes precisaram se adaptar a essa realidade”, explica o coordenador da UTI e intensivista, Jarbas da Silva Motta Junior.
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O pastor Samuel Denardi foi um dos pacientes que precisou recorrer à ECMO para vencer a doença. Internado no dia 29 de julho na UTI, cinco dias depois foi intubado. O pai, também foi infectado pelo vírus, mas sem tanta gravidade. “Foi desesperador. Um dia após a internação do meu marido, nos chamaram no hospital avisando que o Samuel não estava reagindo ao que estava sendo feito e precisava ser submetido à ECMO com urgência, pois era a única chance dele”, relembra a dona de casa Celina Denardi.
Samuel ficou 10 dias ligado à ECMO e teve alta no dia 18 de setembro. “Acho que a preocupação com meu estado de saúde contribuiu para a internação do meu pai. Imagino a pressão que minha família sentiu durante todo esse processo”, ressalta.
O equipamento de ECMO faz o processo de oxigenação do sangue praticamente sozinho, permitindo que o pulmão descanse. Um tubo colocado na perna do paciente puxa o sangue com velocidade de até sete litros por minuto para a membrana extracorpórea, onde é realizada a troca gasosa, retirando o dióxido de carbono e colocando o oxigênio. Depois, o sangue oxigenado volta para o corpo do paciente por meio de uma conexão feita no pescoço. Por se tratar de uma terapia complexa, para incorporar o tratamento com ECMO, além do aparelho, o hospital precisa de capacidade de intervenção avançada e equipes multidisciplinares treinadas para operar o equipamento e acompanhar os pacientes.
Aumento nos procedimentos de alta complexidade também reflete as decisões compartilhadas
Algumas decisões sobre o tratamento administrado na UTI são tomadas diretamente pelo médico e equipe. Mas a participação da família é essencial, principalmente em alguns procedimentos em que é preciso avaliar riscos e benefícios. “Muitas vezes, é possível reverter a doença com suporte intensivo usado temporariamente, isto é, até que o organismo retome o funcionamento normal. Mas são passos que precisamos dar em conjunto: profissionais e família”, explica o médico.
Segundo a psicóloga Ana Laura, a tomada de decisão é um passo muito difícil para a família, que já vive um momento de grande fragilidade emocional. “Ter um familiar na UTI é sempre doloroso. Saber que ele precisa ser submetido a procedimentos mais complexos e a demora na melhora ou da alta fragilizam ainda mais”, diz.
Todo esse processo fez com que a relação da equipe médica com pacientes e familiares ficasse mais humanizada, já que, além da maior gravidade dos casos, o distanciamento fez com que os profissionais fizessem a ponte nas relações. “Cada vitória de um paciente passou a ser ainda mais comemorada por todos os profissionais da UTI. A covid trouxe casos cada vez mais graves e dar uma alta passou a ser uma vitória pessoal”, conclui o intensivista.
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