A Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) iniciou uma pesquisa sobre o impacto da Covid-19 na memória. São inúmeros os relatos de pacientes que comentam sobre perda de memória, inclusive no período chamado “pós-Covid”. Este estudo acompanha os efeitos cognitivos da Covid-19 em mais de 400 pacientes. Eles foram submetidos a uma série de exames no período de seis a nove meses depois da alta hospitalar.
O impacto da Covid-19 na memória também vem sendo acompanhado por outras frentes. O PhD em neurociências, Doutor e Mestre em Psicologia da Saúde e biólogo membro da Society for Neuroscience, o luso-brasileiro Prof. Dr. Fabiano de Abreu Agrela, explica os astrócitos – células que fazem parte do sistema nervoso – são profundamente afetados pelas proteínas da doença. “Em meu estudo, pude averiguar o quanto o coronavírus afeta de forma significativa os astrócitos. O reflexo disso é um dano na memória da pessoa após a contaminação pela doença”, afirma.
De acordo com ele, as células da glia são muito importantes para o sistema nervoso, são responsáveis por diversas funções do dia a dia. “Quando se fala em sistema nervoso, é muito comum que as pessoas lembrem apenas dos neurônios, que estão diretamente relacionados com os impulsos nervosos. Porém, as chamadas ‘células da glia’ ou ‘neuróglia’, desempenham funções primordiais para a manutenção do nosso corpo”, explica.
Os astrócitos fazem parte dessas células especiais. “Eles têm formato estrelado, característica conseguida graças aos seus prolongamentos. Também possuem uma maior diversidade de funções como a sustentação, controle da composição iônica e molecular do ambiente onde estão localizados os neurônios, transferência de substâncias para os neurônios, resposta a sinais químicos, dentre outras atividades”, detalha o neurocientista.
Agrela cita um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Pós-Graduação do Instituto de Ciência e Tecnologia de Okinawa (OIST) – publicado em fevereiro deste ano – para comentar sobre o impacto da Covid-19 na memória. Usando técnicas avançadas de imagem e análise, os pesquisadores registraram a sinalização dentro de astrócitos individuais em um nível de detalhe e velocidade nunca antes visto nos cérebros de camundongos acordados. Sinais ultra rápidos semelhantes aos observados em neurônios e padrões de atividade de sinalização que correspondem a diferentes comportamentos. Isto sugere o papel crucial dos astrócitos em muitas funções do nosso cérebro, incluindo como pensamos, nos movemos e aprendemos.
“Este estudo revelou que os astrócitos geram sinais in vivo tão rápidos quanto os dos neurônios, com duração inferior a 300 milissegundos. Foi usado um vetor viral adeno-associado que continha um gene que faz as células infectadas fluorescerem no aumento da presença de cálcio, indicador da atividade do sinal. Foram percebidas áreas nos astrócitos, hotspots, com níveis de atividades mais altas. Esses hotspots sugerem a representação de engramas de memória, que é um padrão para a memorização”, cita.