Aumento de casos de Covid-19 x aumento na estrutura de atendimento

A falta de oxigênio para pacientes com Covid-19 em Manaus (Amazonas) chocou os brasileiros neste mês de janeiro de 2021. Apesar de uma série de fatores explicar o colapso no sistema de saúde da cidade, especialistas já vinham alertando sobre como a relação aumento de casos de Covid-19 x aumento na estrutura de atendimento não é direta para combater o problema. De acordo com profissionais que estão lidando diretamente na pandemia, os recursos são finitos.

Antes da crise do oxigênio em Manaus, já havia ocorrido a discussão sobre a abertura de mais leitos para atender os doentes com Covid-19 a partir do crescimento no número de casos, em determinados momentos da pandemia. No entanto, especialistas ponderavam que não são necessárias apenas camas para isso, mas também equipamentos e profissionais.

Leia também – Fiocruz confirma caso de reinfecção por nova variante do coronavírus no Amazonas

Em Curitiba (PR), no mês de novembro de 2020, vários hospitais anunciaram que estavam com a capacidade máxima ocupada para atendimento para pacientes com a doença e que não poderiam receber outros. A situação perdurou por semanas, paralelamente ao aumento no número de casos ativos na cidade. Entre novembro e dezembro, a quantidade de pessoas que tinham potencial de transmitir o coronavírus na capital paranaense chegou a quase 15 mil, um recorde em toda a pandemia. 

Houve movimentação por parte dos estabelecimentos, para reforçar a estrutura. A Secretaria Municipal de Saúde também anunciou a reativação de leitos que haviam sido fechados em momento de queda nos diagnósticos positivos.

O presidente da Federação dos Hospitais Beneficentes e Santas Casas do Estado do Paraná (Femipa), Flaviano Ventorim, lembra que as projeções já indicavam aumento de casos no início de 2021, após as festas de fim de ano. O cenário deve sofrer impacto ainda maior com as férias de verão. Várias regiões do país já vinham em aceleração nos diagnósticos de Covid-19 antes mesmo da virada de 2020 para 2021, o que deve favorecer a aceleração em uma base já elevada de transmissão. “Os hospitais são como a faixa de areia segurando a onda todos os dias. Quando vem o tsunami, passa por cima”, compara.

Flaviano Ventorim, presidente da Femipa (Foto: Pedro Vieira)

Ventorim não acredita que a solução para a pandemia ou para fases complicadas desta crise esteja em uma relação direta de aumento de casos de Covid-19 x aumento na estrutura de atendimento, o que abrangeria a abertura de leitos para pacientes. De acordo com ele, muitas vezes são injetados recursos sem o efetivo resultado para conter o avanço da pandemia, mesmo na tentativa de atender a demanda de tratamento dos pacientes. Seria como um ciclo sem fim. 

“A população precisa entender que existe uma limitação estrutural, tanto no Sistema Único de Saúde (SUS) quanto na rede privada. Não posso colocar paciente com Covid-19 em qualquer lugar, por exemplo. Se eu colocar, outros pacientes podem ser contaminados. E não existe apenas a Covid-19. Todas as outras doenças continuam gerando demandas, inclusive por UTI. Acidentes não param de acontecer”, enfatiza. “As estruturas hospitalares são complexas. Não adianta apenas puxar uma mesa e uma cadeira e o problema está resolvido. Não é assim que funciona. Já estamos pagando bem mais caro por respiradores, mas depois não encontramos o restante do que é necessário”, conta Ventorim.

Leia também – Cansaço da pandemia x aumento de casos de Covid-19

Para o médico infectologista Francisco Beraldi de Magalhães, o combate à pandemia de Covid-19 pede estratégias diferentes. Ele lembra que cerca de 10% dos doentes necessita de internação. “Isso parece muito pouco e que não vai impactar o sistema de saúde. Mas precisamos pensar na transmissibilidade da doença, de humano para humano, por via aérea. Considerando uma população cada vez maior, ocupa-se um número grande de leitos. Não tem apenas o quantitativo de leitos, mas também de equipes, recursos humanos. Isso acaba sendo mais difícil. Profissional de saúde não se forma rapidamente”, enfatiza.

Por isto, a estratégia combinada se torna essencial, com a população também se protegendo, evitando a transmissão. Neste momento, isso acontece por meio das máscaras e da higienização das mãos, além do isolamento. Com menos pessoas circulando, a possibilidade de transmissão de pessoa para pessoa diminui. “Abrir leito é uma necessidade, mas é uma das estratégias. Mas muito mais de mitigação do que de combate à pandemia”, opina Magalhães. 

<

p class=”ql-align-center”>Infectologista Francisco Beraldi de Magalhães

Aumento de casos de Covid-19 X aumento na estrutura de atendimento

“Abrir leitos é uma estratégia na medida em que preciso acomodar pessoas que necessitam de atendimento. No entanto, como medida isolada, passa a ser ‘enxugar gelo’ porque não adianta ficar criando leito se a transmissão continuar existindo”, esclarece o médico. “Chega uma hora que não se dá conta do problema”, declara.

Além do número absoluto de doentes por si só – quando há aumento de casos existe consequentemente uma maior demanda por leitos -, toda situação de atendimento também passa pelo “giro” destes leitos. Pacientes com Covid-19 podem ficar um longo período internados, fazendo com que a vaga permaneça indisponível para “novos doentes”.

“Isto não depende exatamente do momento da pandemia e é uma característica desta doença. Os pacientes que precisam internar ou que vão para a UTI não têm alta rapidamente, diferente de outras doenças. São pacientes que demandam de 14, 21 dias de terapia intensiva. E isso dificulta em vários sentidos, não só nos leitos naquele momento, mas também em reabilitação”, frisa o médico infectologista. 

Segundo o especialista, outras experiências de epidemia já mostraram que o processo educativo é a melhor alternativa para um momento como este. As pessoas entendendo o que devem fazer, isso impactará no sistema de saúde, que estará pronto para atender quem realmente possui demanda. Outra estratégia fundamental é a identificação do doente, seu isolamento e daqueles que tiveram contato com ele. “Começa com coriza, acha que não é nada, e está transmitindo o vírus. Importante que as pessoas se monitorem e, caso fiquem doentes, procurem atendimento médico para que seja feita a testagem”, recomenda. 

Leia também – Estou com sintomas da Covid-19: o que fazer?

Leia também – Quais são os efeitos da vacina contra Covid-19? Tire as dúvidas sobre a vacinação

Leia também – Fake news e vacinação: campanha deve esclarecer a população