A telemedicina no Brasil vem se consolidando para um patamar além da pandemia de Covid-19. Este modelo de atendimento foi a solução durante a crise sanitária para atender os pacientes com suspeita da doença que precisavam cumprir o isolamento social. Também se tornou uma maneira de dar vazão às demandas dos serviços de saúde nos momentos mais críticos dos últimos dois anos. O que era uma “emergência” se transformou em um modelo de negócios, uma forma de atendimento bem vista por muitos pacientes e a porta de entrada para o sistema de saúde.
Depois de discussões que começaram no período pré-pandemia e se consolidaram neste intervalo de necessidade por um modelo de atendimento a distância, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou uma resolução com as diretrizes para a telemedicina. Assim como tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que tem o mesmo objetivo.
Este momento é considerado como um marco no sistema de saúde por Caio Soares, presidente da Saúde Digital Brasil (Associação Brasileira de Empresas de Telemedicina e Saúde Digital). “Agora, todos terão segurança jurídica e parâmetros mínimos do ponto de vista legal para balizar a prestação de serviços. Quando não temos lei acontece o famoso ‘vale tudo’. Estamos amparados. As possibilidades de atuação estão muito bem definidas pela resolução do CFM. A sociedade como um todo tem muito a ganhar”, avaliou em entrevista exclusiva ao Saúde Debate.
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De acordo com Soares, a pandemia fez com que a maturação de uma novidade, que era o caso da telemedicina, acontecesse rapidamente. As discussões em torno deste formato de atendimento começaram antes mesmo da Covid-19, mas foi a pandemia que acelerou esse amadurecimento, mostrando o valor e a capacidade destas plataformas.
“A variante Ômicron veio como uma onda devastadora. Tudo o que ouvimos e projetamos sobre a possibilidade de o sistema colapsar aconteceu naquele momento. Todos os sistemas de atendimento foram absolutamente consumidos pelo excesso de demanda em um curto período. Tivemos um aumento de 25 vezes na quantidade de atendimentos em janeiro e fevereiro de 2022 na comparação com dezembro de 2021. Tanto no presencial quanto na telemedicina”, lembrou.
Agora, em uma situação mais “controlável”, as empresas de telemedicina no Brasil verificam um acesso de pacientes em busca de atendimentos para além da pandemia de Covid-19, o que impulsiona o setor e se ajusta ao momento de regulamentação. “Passado aquele momento terrível, verificamos uma estabilização nos serviços. Percebemos que, depois da Ômicron, os atendimentos estão em um padrão quase duas vezes superior, na comparação com o período pré-Ômicron. As pessoas que utilizaram a ferramenta durante esta onda perceberam o valor da telemedicina e passaram a ser usuários recorrentes. Com isso, o número basal dobrou no pós-omicron para atendimentos diversos, em diferentes especialidades”, contou Soares.
A partir da maior procura por telemedicina no Brasil também surgem os desafios. Um deles é o avanço da estruturação das empresas do setor, ainda mais diante da resolução da CFM e da provável aprovação da legislação no Congresso Nacional. Para Caio Soares, o que foi definido até o momento como regulamentação eleva o patamar de exigência para a oferta dos serviços.
“Há uma definição agora mais clara de quais são os parâmetros mínimos para as empresas que oferecem esse tipo de serviço, tanto de qualificação dos profissionais quanto de qualidade técnica. Elevamos o padrão mínimo de qualidade necessário. Com isso, certamente haverá mais confiança dos pacientes e da população como um todo”, afirmou.
O presidente da Saúde Digital Brasil revela que a associação lançará em breve um manual de boas práticas de telemedicina no Brasil, que servirá como uma baliza técnica para a garantia mínima de qualidade na oferta do serviço. Soares cita como exemplo disto a adoção do prontuário eletrônico. “Para prestar o serviço, é necessário ter prontuário eletrônico, para guardar as informações de forma segura. Isso não pode ser feito pelo Whatsapp. A lei nem permite isso. O paciente também precisa de autonomia para, a qualquer momento, acessar essa informação e disponibilizar para qualquer outro profissional. A informação pertence a ele. A telemedicina mostra e prova que esta informação de fato tem um dono: o paciente”, opinou.
Ainda de acordo com Soares, a partir deste processo, a telemedicina vai proporcionar uma redução “gigantesca” de desperdícios no sistema de saúde. Exemplo disto é um raio-x. Se o resultado do exame está no prontuário eletrônico do paciente, a informação pode ser compartilhada entre diferentes profissionais, sem a necessidade de refazê-lo. E isto diminui custos.
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