Estudo confirma predisposição genética e imunológica nos casos graves da Covid-19

Um estudo publicado na revista Science Immunology confirma a predisposição genética e imunológica nos casos graves da Covid-19. A descoberta faz parte das pesquisas conduzidas pelo COVID Human Genetic Effort, um projeto mundial que conta com pesquisadores e instituições de diferentes países. Entre eles está a médica imunologista e pesquisadora Carolina Prando, do Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, de Curitiba (PR), que integra a diretoria internacional e coordenação de centros brasileiros.

O estudo mostrou que cerca de 10% dos casos críticos de pneumonia pela Covid-19 são causados pela presença de autoanticorpos no sangue dos pacientes. No subgrupo de casos letais, o percentual dos autoanticorpos chega a 20%. Esses anticorpos visam especificamente aos interferons tipo 1 (IFN 1), considerados essenciais na defesa do organismo em relação às infecções virais, incluindo o novo coronavírus. “Os experimentos in vitro demonstraram que esses anticorpos bloqueiam o efeito protetor dos IFN 1 na replicação viral. O vírus que desencadeia a Covid-19, portanto, entra nas células sem encontrar resistência e se multiplica de maneira descontrolada”, explica Carolina. No grupo de 1.639 participantes que estavam infectados pelo vírus, porém não apresentavam sintomas da doença, não foram encontrados níveis elevados de autoanticorpos contra interferon tipo 1.

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Os interferons tipo 1 (IFN 1) são proteínas com o papel principal de ativar as defesas do organismo de forma imediata, a partir do momento em que as células do organismo são infectadas por algum vírus. “São considerados os soldados da linha de frente do nosso corpo, lutando contra os efeitos gerados por uma infecção logo quando surgem os primeiros sintomas, seja um resfriado, uma gripe ou a Covid-19”, exemplifica a médica.

Além disso, a pesquisa detectou que, entre 34 mil indivíduos avaliados que não tiveram Covid-19, de diferentes faixas etárias e sexos, uma parte da população apresenta autoanticorpos direcionados contra os IFN 1. Isso sugere que os autoanticorpos sejam, de fato, a causa da Covid-19 grave em parte da população, e não um efeito subsequente à doença. Os autoanticorpos contra interferon tipo 1 são muito raros antes dos 65 anos (0,2% a 0,5%) e aumentam exponencialmente com o envelhecimento, chegando a 7% na idade de 85 anos. “Isso nos fez compreender melhor a distribuição desses autoanticorpos na população geral não infectada e contribui para explicar a influência da idade, que é um fator de risco para as formas graves da Covid-19”, completa Carolina.

Conforme a pesquisadora, os resultados do estudo apresentaram um fator de risco importante e mensurável. “Com esse conhecimento, podemos intervir precocemente. Se identificamos pacientes com autoanticorpos, pode-se considerar uma internação precoce, com nível de observação mais rigoroso, uma filtragem do plasma por meio da plasmaférese, bem como a prioridade desse grupo para a vacinação. Além disso, o estudo também tem impacto nas propostas de tratamento com plasma de convalescente, evitando coleta de pessoas que tenham apresentado quadro grave de Covid-19 ou tenham os autoanticorpos comprovadamente circulantes”, aponta.

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O consórcio COVID Human Genetic Effort, do qual faz parte o Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, é liderado pelos pesquisadores Jean-Laurent Casanova, da The Rockefeller University, e Helen Su, do NIH.  Quatro estudos publicados pelo grupo desde setembro de 2020 fornecem uma explicação molecular e imunológica para cerca de 20% dos casos críticos de Covid-19, em que a produção de interferons tipo 1 está prejudicada por mutações patogênicas em genes importantes para esse processo, ou a presença de autoanticorpos neutraliza/destrói/inativa o interferon tipo 1 produzido. Essa descoberta publicada nos artigos de 2020 foi homenageada pela revista Nature em seus dez maiores avanços científicos para o ano.

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