Uma das grandes discussões durante esta pandemia é sobre a relação do novo coronavírus e os anticorpos depois da infecção, ou seja, sobre como fica a imunização após a Covid-19. Uma grande parcela dos doentes consegue se recuperar da doença, que atinge a população em diferentes níveis de sintomas. Mas ainda não foi possível traçar um perfil imunológico preciso sobre a saúde destas pessoas depois da recuperação. Por isto, não há certeza absoluta se todas estão efetivamente imunizadas ao novo coronavírus e nunca mais serão infectadas novamente.
O médico intensivista Fernando Henrique Gonçalves, do Hospital Vita, de Curitiba (PR), explica que existem três cenários atualmente sobre o coronavírus e anticorpos. O primeiro deles aponta que boa parte das pessoas recuperadas teriam uma imunidade permanente em relação à doença. O segundo cenário traz uma imunidade parcial, de fraca a moderada, com a possibilidade de uma infecção leve após um a dois anos. E o terceiro cenário indica a possibilidade de as pessoas serem infectadas novamente pelo novo coronavírus. “E esperamos que este seja uma pequena parcela da população”, salienta.
O especialista conta que as respostas para uma série de perguntas sobre coronavírus e anticorpos vão surgir apenas nos próximos meses. Neste momento, as informações precisas são difíceis, até mesmo pela dificuldade com os testes em uma grande parcela da população.
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Estes três cenários foram delineados, de acordo com Gonçalves, após estudos na Coreia do Sul terem detectado o vírus novamente em pessoas que já haviam se recuperado da doença, o que levantou a suspeita de imunização parcial. Além disto, já existem trabalhos com outros tipos de coronavírus (que não são o SARS-CoV-2, popularmente chamado de novo coronavírus) que mostram quadros semelhantes. “Por isto que deveriam ser avaliadas ideias como os ‘passaportes de imunidade’ para liberar a circulação de pessoas, como chegou a ser cogitado em alguns países. Vamos supor que uma pessoa tenha imunidade parcial. Ela teve contato com vírus, desenvolveu imunidade. Mas e se depois de um tempo se transformar em um vetor de transmissão?”, questiona Gonçalves.
Um dos testes rápidos que serão disponibilizados pelo Ministério da Saúde vai indicar se uma pessoa teve contato com o novo coronavírus – lembrando que parte da população não apresentará sintomas da Covid-19 – e se houve resultado imunológico. “No entanto, o teste não vai apontar se esta imunidade é permanente”, salienta o médico.
Uso do plasma no tratamento da Covid-19
A relação entre coronavírus e anticorpos pode gerar um tratamento para doentes da Covid-19. Estão em andamento pesquisas sobre o uso do plasma sanguíneo de pacientes recuperados da doença. O procedimento consistiria na transfusão do plasma, que é a parte líquida do sangue, de um paciente curado para um que ainda está em tratamento. A expectativa, com este tipo de terapia, é que os anticorpos presentes no plasma forneçam imunidade às pessoas com Covid-19.
O Ministério da Saúde informou no dia 13 de abril que monitora pesquisas neste sentido, além de outras que visam identificar um tratamento específico para a doença. Ainda não há um tratamento comprovado para a cura do paciente com a Covid-19.
Para Gonçalves, é necessário considerar o tratamento com o plasma como experimental. “O que se avalia é um estudo nesta administração e na medição da carga viral, para saber se é efetivo. É possível que ele seja, sim, teoricamente e também na prática”, avalia. Entretanto, o médico intensivista classifica que o procedimento possa talvez ser recomendado para um perfil específico de doente e lembra que pode até mesmo haver dificuldade em encontrar pacientes recuperados que estejam habilitados para doar. Por isto, é necessário acompanhar.
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Proteção
O desenvolvimento de uma vacina e um tratamento realmente eficaz contra a Covid-19 protegeriam a população. No entanto, como estas duas ferramentas não existem neste momento, o isolamento social continua sendo uma estratégia para a preparação do sistema de saúde – evitando o seu colapso com a explosão de casos em um curto período – e para a imunização gradual da população, até que os números caiam gradativamente.
“Em um isolamento parcial, como o que está acontecendo na maior parte do Brasil, o vírus se espalha, mas em uma velocidade menor. E o sistema consegue absorver de uma melhor forma e as pessoas se imunizam de alguma forma. Não fazer qualquer tipo de isolamento traz o pior cenário, com um número de casos acentuado. Neste momento, parece que o isolamento colaborou, com a uma chegada do vírus com uma velocidade mais moderada, permitindo que o serviço de saúde, tanto público quanto privado, se preparasse”, opina Gonçalves sobre o que está acontecendo na região de Curitiba (PR).
De acordo com ele, este é o motivo pelo qual o isolamento não pode ser relaxado. O médico novamente cita o exemplo da capital paranaense, onde a adesão ao distanciamento social já é menor nos últimos dias, na comparação com o início das ações de combate ao novo coronavírus. O médico afirma que isto pode causar um reflexo nas transmissões, se somando às projeções anteriores de aumento no número de casos entre o final de abril e início de maio.