O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Clóvis Arns da Cunha, reafirmou a absoluta necessidade de isolamento social neste momento como forma de combate ao novo coronavírus no país. A afirmação foi feita nesta quarta-feira (25 de março), durante entrevista coletiva online.
A entidade já havia manifestado, por meio de nota de esclarecimento, preocupação com o pronunciamento do presidente da República, Jair Bolsonaro, na noite da última terça-feira (24), quando ele disse ser contra o fechamento de escolas e se manifestou a favor de um isolamento social parcial no atual cenário, restrito aos grupos de risco (idosos e pessoas com doenças pré-existentes). Além disto, Bolsonaro classificou a Covid-19, infecção causada pelo novo coronavírus, como um “resfriadinho”.
A SBI considerou que a mensagem do presidente podem dar a falsa impressão à população que as medidas de contenção social são inadequadas, enfatizando a absoluta necessidade de isolamento social neste momento. “Principalmente para quem entra em fase de transmissão comunitária, como São Paulo e Rio de Janeiro, e em algumas capitais, as medidas são realmente o que vai fazer diferença lá na frente”, salientou Cunha.
De acordo com ele, é importante fechar as escolas para evitar a transmissão do vírus a partir das crianças para os avós, que fazem parte dos grupos de risco. “Para o neto, provavelmente, esta nova doença será leve. Pode até passar desapercebido. Mas para o seu avô ou para a sua avó pode ser fatal. Neste momento, é importante que toda sociedade esteja junta para estarmos adotando atitudes adequadas”, opinou. Cunha informou que 80% dos casos de Covid-19 serão leves; 15% vão necessitar internação em hospitais; e 5% serão de casos mais críticos, com a necessidade de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
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O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia afirma que Bolsonaro acerta ao falar que os brasileiros devem evitar o pânico e a histeria, e também quando elogia o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. “E quando o presidente diz da preocupação das famílias e das repercussões socioeconômicas, que já estão sendo desastrosas em todo o mundo. Mas temos uma grande vantagem: o Brasil está de três a quatro semanas atrás da Europa e dos Estados Unidos. Podemos ver o que deu certo e o que deu errado. Lógico que devemos aproveitar esta experiência”, indicou.
A importância dos testes
Cunha destacou a importância da testagem para o combate ao novo coronavírus. Os testes vão permitir um raio-x do cenário brasileiro e a diferença das infecções registradas, entre resfriados, gripes e Covid-19, favorecendo a adoção de medidas diferenciadas. Os resultados podem basear, até mesmo, o relaxamento das ações já adotadas de isolamento social e fechamento de comércio, por exemplo.
“Nas próximas semanas, com a chegada dos novos testes de diagnóstico, poderemos ter uma fotografia melhor da nossa epidemiologia e, assim, tomar atitudes. E até, eventualmente, voltar à vida o mais perto do normal em algumas regiões. O Brasil é um país continental. O que está acontecendo em São Paulo é diferente de outras regiões. O importante vai ser viver a cada dia, em especial os dados epidemiológicos. Afinal, achatamos a curva e está sob controle? Somente fazendo testes diagnósticos é que vamos ter esta resposta”, enfatizou Cunha.
O presidente da SBI ainda revelou que as situações que mais preocupam neste momento são as de São Paulo e Rio de Janeiro, estados onde há registros de mortes e os maiores números de confirmações da Covid-19. “Por outro lado, em Curitiba, no Paraná, e nas outras capitais de modo geral, teremos uma chance única, com as medidas de isolamento e fechamento, de evitar destas cidades terem o mesmo contexto de São Paulo. Talvez São Paulo, com agora uma restrição maior ainda, possa evitar o que está acontecendo agora na Itália e na Espanha, por exemplo”, comentou.
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Diante deste cenário, Cunha lembrou da absoluta necessidade de isolamento social neste momento e disse que não há uma estimativa de quando as medidas devem ser alteradas. “Estou confiante que estas medidas sejam suficientes para achatar a curva. Pode acontecer de medidas diferentes começarem a ser adotadas em cenários diferentes, desde que haja um diagnóstico epidemiológico correto. Tudo vai depender da evolução da epidemia. Se nada tivesse sido feito, esperaríamos um pico no Brasil, especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, entre duas a quatro semanas. E, agora, com todas estas medidas, em uma semana poderemos ter uma ideia se as medidas foram eficazes ou não”, argumenta.
O presidente da SBI explica que o tempo de encubação do vírus é curto, de quatro a cinco dias. As pessoas, estando em casa, em uma semana não transmitem mais o vírus de uma para outra. “Acredito que, no início da próxima semana, os números poderão dizer se conseguimos mudar esta curva e até mesmo diminuir ou se, infelizmente, mesmo tomando medidas, isto não foi suficiente para reduzir os casos”. Se isto não tiver acontecido, atitudes mais drásticas podem ser tomadas, como a quarentena.
“Resfriadinho”
O presidente da SBI afirmou que usar o termo “resfriadinho”, como fez o presidente Bolsonaro em seu pronunciamento, pode deixar a impressão que a Covid-19 é uma infecção sem gravidade. De acordo com Cunha, a letalidade está na casa dos 3% e é mais comum em pacientes idosos e com comorbidades. Acima dos 80 anos, a letalidade aumenta para 15% a 20%. “Mas estão sendo registrados casos de jovens internados com pneumonia. Todos evoluíram bem, mas são pacientes que às vezes necessitam de oxigênio por três a quatro dias. Do ponto de vista médico e também do científico, não podemos comparar a Covid-19 com um resfriado”, esclareceu.