Violência Patrimonial contra a mulher e pensão alimentícia

São muitos obstáculos que interferem na independência financeira de mulheres. Uma grande maioria não pode se dedicar ao trabalho na forma e na medida de seu potencial profissional, já que com a sua entrada no mercado de trabalho, todas as obrigações e o trabalho não remunerado que exerciam antes, no casamento, na maternidade e na vida doméstica, não ficaram para trás. São muitas jornadas para as quais a mulher tem que se dedicar e se dividir, a conta não fecha.

 

Todas essas jornadas e obrigações que se acumulam ao trabalho fora de casa poderiam ser divididas, mas não são. Isso só contribui para que mulheres não consigam realizar todo o seu potencial profissional e não tenham o retorno financeiro respectivo, muitas vezes desistem e se dedicam só ao trabalho não remunerado, em casa, para a casa e para a família. Não há nada de errado nisso, desde que seja uma escolha, que seja consciente e que possa ser suportada no caso de imprevistos, contratempos, mudanças de planos, ou seja, em caso de divórcio ou separação, por exemplo.

 

No entanto, infelizmente, ainda é comum mulheres que nunca trabalharam ou foram obrigadas a deixar de trabalhar por conta dos cuidados com os filhos, por demissões injustas após o gozo da licença maternidade e a dificuldade de retornar ao mercado de trabalho pelos mesmos motivos, se vejam em desamparo financeiro grave em casos de rompimento do casamento ou união estável.

 

Nesses casos, mulheres se vêm dependentes do pagamento pelo ex-marido/companheiro de uma pensão alimentícia para si (ainda que em caráter provisório, até que consiga se recolocar no mercado de trabalho) e aos seus filhos, e é comum que essa situação leve à violência patrimonial.

 

Conforme dispõe a Lei Maria da Penha, a violência patrimonial se configura por “qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;” (Lei Maria da Penha, art. 7º, inciso IV)

 

Nessa previsão legal, podemos incluir a situação em que a mulher que depende do pagamento de alimentos, seja para si e seus filhos ou mesmo somente para seus filhos, se vê privada do pagamento de tais alimentos dentro do que foi acordado e conforme a necessidade. Ou seja, há muitos casos de não pagamento, pagamento em atraso e/ou abaixo do valor devido dos alimentos arbitrados para as despesas com alimentação, moradia, vestimentas, materiais escolares, transporte etc.

 

Então, o não pagamento da pensão alimentícia em dia, em valor integral e conforme as despesas reais, causam angústia e sofrimento a essa mulher que não tem como assumir e arcar sozinha com todas as despesas nessa nova realidade, levando a uma privação de valores essenciais para a sua sobrevivência e de seus filhos. Isso é a expressão de mais uma forma de violência contra a mulher, resultado de nossa cultura machista e patriarcal.

 

Essa privação afeta diretamente a dignidade dessas mulheres, fragiliza e, sem dúvidas, as submete ao controle e manipulação por parte de seus ex-cônjuges, em especial no contexto de uma separação, em situações em que ainda se discute partilha de bens e guarda de filhos, principalmente.

           

Não podemos deixar de identificar todos as formas de violência contra a mulher, em todas as situações em que são atingidas em sua dignidade, e, principalmente, não podemos deixar de orientar, mobilizar, alertar e discutir soluções para que mulheres tenham independência, em todos os sentidos, que possam impor limites e que tenham a possibilidade de manter essa dignidade. Ter educação, ter consciência, ter trabalho, ter disponibilidade para esse trabalho, ter apoio, dividir tarefas e cuidados, poder ter tranquilidade para escolher e decidir sobre todas as questões de sua vida. Ter autonomia para viver.

 

É muito importante que haja essa consciência em toda a sociedade, nas relações conjugais, nas famílias e, também, no judiciário, e que seja possível considerar essas situações para que mulheres e seus filhos tenham assegurados todos os seus direitos.

 

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