Ser mulher não é fácil. ‘Ser’ não é fácil para ninguém, para mulheres muito menos. Até porque, muitas de nós existimos, não somos. E o que quer dizer isso? Quer dizer que desde muito pequenas somos moldadas a servir para caber nos lugares, apertadas para caber onde as pessoas entendem que devemos estar. Além de que somos ensinadas que não devemos expressar o que somos de forma livre, isso não é educado e nem é bem recebido, muito menos é seguro. Afinal, a espontaneidade ofende a quem não está confortável para viver a sua própria.
Então, em tempos de carnaval e pós carnaval, para muitos um período de recolhimento e reflexão, muito se fala em exposição e no avesso dela. Muito se fala sobre a exposição da mulher, do seu corpo, da forma como se veste, como se comporta, com quem e onde está e, sobretudo, vivenciamos as consequências disso tudo em relação à mulher.
É claro que o julgamento da mulher sobre o seu comportamento e sua conduta diante de tantas regras sociais – comandos padrão impostos de forma tão sutil que acreditamos ser o certo irremediável, algo que não se discute -, nos rondam todo o tempo, mas nesse momento é algo que sobressai. A mulher é jogada aos leões e vai do julgamento da palavra à violência que ele determina, se torna vítima da intolerância disfarçada de moralidade e da liberdade criminosa de quem ataca mulheres que ousam extrapolar certos limites.
É importante deixar claro que não falamos de comportamento e conduta que extrapolam a normalidade, mas da expressão livre do ser, da vontade própria e da dignidade de manifestar a sua vontade, de usar a roupa que bem entender, de andar segura pelas ruas, de estar sozinha nos lugares e de ir e vir quando e como quiser.
Infelizmente, não podemos nos expressar livremente. Como é comum, muitos casos de violência contra a mulher são justificados pelos agressores ou por qualquer pessoa, pela vestimenta, pelo local e horário onde estão ou pelo seu comportamento. Nesse contexto, muitas mulheres são vítimas de todo tipo de violência, apenas por tentarem ser quem são e viver sem limitações de tempo, lugar e espaço.
Então, somos tolhidas desde sempre, a espontaneidade vai ficando para trás e quando paramos para pensar em quem éramos ou quem imaginávamos nos tornar, é quase impossível lembrar. Que sonhos tínhamos? Quem éramos quando crianças? O que deixamos apagar em nós? O que sufocamos para seguir em frente? Como seria se seguíssemos aqueles planos de criança? O que fazer para “ser” sem julgamentos e violência?
Por que não?
* Viviane Teles de Magalhães Araújo é advogada graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO, com atuação no mercado corporativo nas áreas cível e trabalhista; Doutoranda em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP; Mestra em Direito (Direitos Fundamentais Coletivos e Difusos) pela Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP – Piracicaba/SP; Especialista em Direitos Humanos e Questão Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná; MBA em Direito Empresarial pela FGV – Fundação Getúlio Vargas – Campinas/SP; Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie – Campinas/SP (2008/2010). Autora do livro “Mulheres – Iguais na Diferença” (ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris 2018) e do artigo “A igualdade de direitos entre os gêneros e os limites impostos pelo mercado de trabalho à ascensão profissional das mulheres. (25 ed.Florianópolis: CONPEDI, 2016, v. , p. 327-342).
Confira outras colunas de Viviane Teles de Magalhães clicando aqui.
Conheça também os demais colunistas do portal Saúde Debate. Acesse aqui.