Holocausto

Acordávamos às 6 da manhã de todo santo dia. Os mais fitness ainda corriam até aquela academia (aquela mesma do grande apoiador do genocida espalhada pelo Brasil hoje em dia). Fazíamos exercícios esfalfantes para seguirmos as regras midiáticas da magreza de corpos esbeltos, seguíamos para o trabalho de 8 horas diárias; alguns, ainda, faziam seus happy hours sagrados nos bares mais curtidos e em voga do momento para conversarem, contarem piadas, encetar possíveis namoros. Corríamos, bebíamos, comíamos, descansávamos, trabalhávamos, vivíamos intensamente, gastando o que ganhávamos em divertimento e responsabilidades (alguns). Até março de 2020 ou, precisamente, 18 de março de 2020 era essa nossa rotina, nosso dia a dia!

 

O mundo mudou, o coronavírus se infiltrou por todos os lados, matando mais de 300 mil brasileiros e brasileiras, de todas as idades e credos e raças e condição social. Neste ponto, equilibrou a sociedade brasileira, pois infectou e matou gentes de todas as classes estatísticas existentes. “Nunca antes na história deste país” houve equilíbrio e igualdade parecidas – a infecção e a morte para todos. Não importa se rico ou pobre, branco ou preto, homem ou mulher. A morte foi dramaticamente igualitária, ceifando quem estivesse pela frente! A infecção colocou no mesmo nível todo e qualquer ser!

 

Na letargia de governos imprudentes, mentirosos, genocidas, desacreditados, desavergonhados, incompetentes, despreparados, interessados somente em reter nos bolsos os milhões das rachadinhas e outros esquemas corruptos que juraram acabar na eleição, nos deparamos com a morte, sim… aquela criatura envolta numa capa preta cujo rosto é uma caveira a segurar nas mãos a foice que ceifa vidas! Sentimo-nos desamparados, sem ter a quem recorrer, a quem implorar por ajuda, a quem abrandar nossa dor ante a tétrica conta de mais de 3.000 mortes diariamente!

 

Se a década de 1980 foi a década perdida da economia e do crescimento para o Brasil, a década a partir de 2020 pode ser a pior época que jamais enfrentamos neste dolorido, maltratado e pobre país. Mortos empilhados por todos os cantos, infectados jogados em qualquer lugar; pessoal da linha de frente da saúde cansados, estressados, sob pressão contínua e desmotivados pela falta de atenção de governos; população completamente perdida e abandonada ao deus dará da falta de políticas abrangentes de cuidado e preservação da saúde; coordenação da campanha de vacinação entregue às moscas, destruindo o grande legado do SUS nesta área … Meu Deus, nem sabemos mais quantos erros foram cometidos apenas em nome de uma maldita reeleição e da perpetuação dos genocidas no poder, a qualquer custo. Malditos sejam e que venham a arder nos caldeirões ferventes do meio do inferno.

 

Morremos asfixiados, como ratos envenenados, como galinhas nas granjas que não suportam o calor extremo e não há a quem clamar, a quem reclamar, a quem pedir ajuda. Se o Apocalipse estava distante em nossa visão descrente, agora vemos que as verdadeiras bestas com suas trombetas anunciadoras do fim estão a nossa volta consumindo-nos, matando-nos e deixando-nos sem alternativa. É como se voltássemos ao tempo e assistíssemos ao holocausto acontecendo na Europa e nada sendo feito para impedir. Milhões foram mortos, milhões ficaram com sequelas imensas, e pergunto-me se não estamos presenciando algo muito parecido, pois milhares de brasileiros e brasileiras morrem todo o dia pela inépcia de quem deveria ser o primeiro no front!.

 

Culpem a China, culpem Madagáscar, culpem Tuvalu ou até mesmo a Noruega. Mas quem está ajudando a matar o povo brasileiro está muito belo e formoso assentado na cadeira da presidência sem mover uma palha para proteger-nos. Nossa responsabilidade é o distanciamento social, o uso de máscaras, álcool gel, água e sabão na higiene das mãos, e enclausuramento em casa, pois é o que podemos fazer individualmente, já que ações coletivas e diretivas para políticas públicas dignas e eficientes não existem ou foram implantadas tarde demais. Continuemos em casa por mais um, três, seis meses, um ano, partilhando das lojas fechadas nos centros das cidades, dos pequenos comércios que nunca mais reabrirão por que não tiveram condições de suportar “lockdowns”, das pessoas perdendo seus empregos e sem ter o que comer… Que seja a China, a Rússia ou Benin os responsáveis, podemos imputar a culpa a qualquer um, mas o principal responsável pelo holocausto das 300 mil mortes está no Brasil.

 

Em 30 de abril de 1945 Hitler tirou sua própria vida com um tiro e Eva Braun suicidou-se com veneno, porque o ditador já não tinha mais condições de continuar sua “Mein Kampf” sem apoio da população e dos fascistas lunáticos e fanáticos que nele acreditavam como seu verdadeiro líder, abrindo, dessa forma, as portas para o término da Segunda Guerra Mundial. Foi a única solução plausível, a solução final, para um dos grandes genocidas de todos os tempos: sua própria morte!

Para saber mais, leia a magistral biografia de Hitler:

Hitler de Ian Kershaw, Companhia das Letras, 2010, São Paulo (1077 páginas).

* Gilmar Rosa é graduado em Administração de Empresas pela Universidade Positivo e História – Memória e Imagem pela Federal do Paraná. Executa, atualmente, atividades voltadas ao desenvolvimento de projetos e planejamento estratégico em cooperativa médica. É colunista do portal Saúde Debate

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