Caminhos ao léu

A construção das rodovias nacionais ganhou impulso somente após a década de 1940, quando em 1946 foi instituído o Fundo Rodoviário Nacional. Porém, com maior ênfase a partir da década de 1950 com a criação da Petrobras (1954), que passou produzir o asfalto necessário e com a implantação da indústria automobilística no Brasil em 1957.

Hoje em dia é muito fácil deslocar-se pelo território nacional utilizando-se da rede de rodovias federais e estaduais, a par a situação calamitosa de algumas.

Muito mais difícil é encontrarmos o caminho que pode nos levar ao encontro da felicidade, por meio de sendas, veredas e trilhas, quase sempre sem asfalto, recobertas só com a lama e o barro de decepções, desilusões e recomeços. Não existem placas direcionando-nos, tampouco a velocidade que usaremos é mostrada. Seguimos, às vezes, jogados ao léu, recobertos pela neblina, pelo sol, pela escuridão, na direção que nossa experiência e conhecimento do mundo nos apontam, mesmo sem ainda termos a absoluta e concreta certeza do destino almejado.

Tal e qual os naufrágios relatados, em que as boias e coletes salva-vidas nos resgatam das águas turbulentas, durante toda uma caminhada rumo à felicidade, será possível encontrar pontos de apoio em meio a desorientação de dias sombrios e frios. Haverá tantos obstáculos que competirão com os inúmeros marcos que deveremos encontrar nesta trilha tresloucada que é a vida! Pessoas, lugares, ações, sentimentos, palavras serão o combustível a alimentar nossa alma e coração para chegarmos naquele ponto em que poderemos nos sentir descansados e quase realizados.

Diariamente construímos nosso sistema rodoviário interno, sorvendo a presença dos amigos e queridos com seus afetos e abraços, aproveitando cada minuto possível com nossas famílias, absorvendo traços e ensinamentos dos colegas ao redor, usufruindo das qualidades de cada um, saboreando as conversas, os risos, as lágrimas e o olhar marcante que nos cativam.

O que nos faz ir em frente constitui-se de um grande apanhado das relações que mantivemos ao longo dos anos com tantas e tantas pessoas ou personagens manifestando seus conhecimentos, amores, defeitos, dedicação, carinho, compreensão. Com essa bagagem e cabedal disponíveis em nossa mente, seguimos céleres, lépidos e faceiros. O ruim, o mau, a opressão, o desprezo, a dor, acompanham-nos, só que não são suficientes para obrigar-nos a pararmos. A lembrança de um olhar poderá ser mais forte que toda a tristeza e empecilhos que teremos adiante pelo caminho, pois poderemos recorrer ao nosso arquivo mental e buscar suporte naquele olhar, naquele sorriso, naquela voz, a fim de superarmos o que quer que seja ou aconteça.

Nossa breve jornada neste espaço material e concreto em que vivemos, não permite que desperdicemos qualquer momento de relacionamento. As redes sociais de hoje empurram-nos para contatos fugazes e narcisistas, mas não tenho certeza se elas terão como manter relacionamentos duradouros e verdadeiros, criados a partir de interações reais, toques físicos (sem considerar a pandemia), sorrisos e gargalhadas sinceras, lágrimas e tristezas escancaradas, palavras de solidariedade e carinho disparadas sinceramente, enfim, contato humano tête-à-tête, olhos nos olhos!

À medida que o tempo avança e nos tornamos mais arcados pelo peso da idade e da razão, sentimos que o mais significativo a conservar são, sem dúvida, os relacionamentos… manter perfis nas redes sociais não garante que tenhamos ombro amigo para confidências nem para ajuda mútua. É importante criar, manter e conservar contatos humanos, não cibernéticos dissolvidos na nuvem, mas aqueles do tipo que poderemos abraçar e apertar fortemente quando houver possibilidade de reencontro.

Que nossas sendas, trilhas e caminhos sejam repletas de marcos humanos reais, providos de sentimentos e compaixão. Essas sendas nunca serão estradas asfaltadas e iluminadas, porque a vida não é só alegria e felicidade o tempo todo, ledo engano pensar dessa forma. Saibamos conservar nossas pontes de madeira, nossos túneis escuros e nossas sendas sem acostamento, apenas mantendo o que temos de comum com as outras pessoas: sentimentos, emoções, experiências.

Escadaria de trilha na Boca da Barra – Ilha de Boipeba/BA. Créditos: Acervo Gilmar Rosa.

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*Gilmar Rosa é graduado em Administração de Empresas pela Universidade Positivo e História – Memória e Imagem pela Federal do Paraná. Participou na execução de um dos mais importantes projetos de implantação de APS no estado do Paraná em 2014. Atualmente, busca um lugar ao sol que tenha águas cálidas e agradáveis durante todo o ano. 

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