Paraná não teria leitos nem respiradores suficientes para crise da Covid-19, segundo UFPR

    Especialistas do Programa Educação pelo Trabalho em Saúde, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), chegaram à conclusão que o Paraná não teria leitos nem respiradores suficientes para crise da Covid-19, a infecção causada pelo novo coronavírus. A análise foi baseada em projeções matemáticas realizadas pela Imperial College London para as transmissões no Brasil, com cenários mais pessimistas e otimistas a partir da adoção de medidas por parte da população, em especial o distanciamento social.

    O grupo da UFPR fez avaliações para todas as regiões do Paraná, adotando um meio termo entre os cenários pessimistas e otimistas citadas nas projeções da instituição internacional.

    No litoral do estado, por exemplo, partiu-se do princípio que até 10% da população poderia ser infectada com o novo coronavírus, observando um cenário real em que não existe uma supressão generalizada da circulação de pessoas. Conforme as análises da UFPR, as projeções apontam que até 30 mil pessoas podem ser infectadas pelo novo coronavírus e, destas, 19% precisariam de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e ventiladores mecânicos. Isto corresponde a 5.643 pacientes. No entanto, conforme citação da universidade, a região conta com 21 leitos de UTI em Paranaguá para atender todos os municípios do litoral.

    O estudo internacional foi realizado há cerca de duas semanas. No Brasil, recentemente tem se obervado uma tendência de afrouxamento das medidas restritivas, com reabertura de comércios e menor aderência da população ao distanciamento social.

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    Carla Straub, professora de Saúde Coletiva e integrante do PET, esclarece que o Sistema único de Saúde (SUS) é organizado em regiões. “Se pensarmos na lógica do sistema, a menor unidade é a região. A maioria dos municípios da região litorânea é de baixo e médio porte e não compota a estrutura necessária para abrigar uma UTI, que exige equipamentos, equipes treinadas, entre outros aspectos. A distribuição dos leitos segue a lógica da economia de escala. Por isso, Paranaguá, como maior cidade do litoral, concentra a chamada atenção especializada, que inclui os leitos de UTI”, esclarece.

    O cuidado intensivo é bastante específico e requer uma estrutura física e de equipe técnica adequada como médicos intensivistas, médicos infectologistas, enfermeiros especializados, bioquímicos para realização de certos exames, entre outros, de acordo com ela.

    “Essas estimativas são importantes para compreendermos a nossa capacidade instalada. A capacidade do SUS é condizente com um padrão de doenças e agravos habituais. Mesmo assim, há estudos que indicam uma baixa proporção de leitos para habitantes quando comparado a outros países. Além disso, temos uma desproporção entre leitos públicos e privados”, afirma a professora. Para o estudo, foram contabilizados os leitos públicos e privados existentes no litoral do estado.

    “Chegamos à conclusão de que os leitos de UTI no litoral paranaense são distribuídos de uma maneira muito desigual. Se uma pessoa de Guaratuba, por exemplo, tem uma complicação, seja pela Covid-19 ou o por outro problema, precisa se deslocar até Paranaguá para ser atendida, o que é impraticável em um caso de vida ou morte. No caso específico da Covid-19, estima-se que muitas pessoas precisarão de suporte de terapia intensiva e essa relação entre população e leitos de UTI não dá conta, mesmo no melhor cenário”, afirma o professor de Saúde Coletiva da UFPR e coordenador do PET-Saúde, Marcos Signorelli.

    Outras regiões

    Neste levantamento que mostrou que o Paraná não teria leitos nem respiradores suficientes para crise da Covid-19, o grupo também fez a projeção para outras regiões do estado, tendo sempre como base as regionais de saúde. A 21ª regional, de Telêmaco Borba, compreende sete municípios e conta com 12 leitos de UTI e 14 respiradores. Se 10% da população regional fosse infectada, 18.845 pessoas, 942 leitos seriam necessários (5% da população total).

    A 3ª regional, de Ponta Grossa, por sua vez, compreende 12 municípios e tem à sua disposição 136 leitos de UTI e 179 respiradores. Caso 63.729 pessoas, apenas 10% da população dessa região, se contaminassem com o coronavírus, 3.186 leitos seriam necessários.

    Na 22ª regional, Ivaiporã, estão disponíveis 49 leitos de UTI e apenas 30 respiradores. A microrregião compreende 16 municípios e teria 12.864 contaminados, sendo que 643 seriam casos graves. Já a região de Irati, 4ª regional, atende nove cidades e possui 23 leitos de UTI e 41 respiradores. Caso o cenário de 10% da população atingida se replicasse ali, 17.493 indivíduos seriam infectados, sendo que 874 careceriam de tratamento intensivo.

    Com 29 municípios, a 2ª regional, que abrange Curitiba e região metropolitana, tem a maior população do estado do Paraná. Tendo como parâmetro os mesmos 10% de contaminados, 365.496 seriam acometidos, dos quais 18.274 casos graves iriam requerer tratamento intensivo com respiradores. A região dispõe de apenas 981 leitos de UTI e 1.625 respiradores.

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    Importância do estudo

    Para Carla, o objetivo do estudo é demonstrar a importância do isolamento para o achatamento da curva e para ganhar tempo. “Tanto para a busca de tratamento e de vacinas, como para uma resposta do sistema de saúde com adaptações que estão em curso como a abertura de novos leitos, a ampliação de recursos físicos e humanos e também para ter uma capacidade instalada adequada à demanda”.

    “Há uma assimetria regional muito intensa no Brasil, com concentração de leitos de UTI em algumas regiões, como a sudeste. Mesmo dentro do Paraná há essa assimetria. Por isso, esse contexto deve encaminhar a criação de uma central única de regulação de leitos, a exemplo da Espanha. Semana passada já foi criado um cadastro único para os profissionais de saúde”, aponta a professora.

    Para ela, a solução estaria não em abrir leitos de UTI em todas as cidades, mas em criar mecanismos que se adaptem à lógica de um sistema de saúde que atende a uma região. Transporte rápido de urgência e emergência, mais helicópteros à disposição e UTI móveis seriam algumas opções.