Chegada do Mounjaro ao Brasil: quais são os desafios e oportunidades que o medicamento vai trazer para o tratamento da diabetes e obesidade?

Mounjaro
(Foto: Freepik)

Na última sexta-feira (25), a farmacêutica Eli Lilly anunciou em comunicado que o Mounjaro (tirzepatida) chegará às farmácias brasileiras ainda na primeira quinzena de maio. A data de lançamento, que estava prevista para junho, foi adiantada e a expectativa é de que no próximo dia 15 o medicamento já possa ser encontrado em todo o território nacional.

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Aprovada em 2023 pela Anvisa, a caneta injetável é uma nova opção para o tratamento de diabetes tipo 2 e também vem sendo utilizada de forma “off label” para perda de peso. Concorrente do Ozempic e Wegovy (semaglutida), o Mounjaro foi alvo de diversas pesquisas clínicas, que apontaram um desempenho superior em relação aos demais medicamentos no que diz respeito a uma maior perda de peso e mais eficácia no controle da glicemia. Assim como o Ozempic, a nova droga também é administrada por meio de injeções semanais.

De acordo com Alessandra Rascovski, endocrinologista e diretora clínica da Atma Soma, além de fundadora do Ambulatório Clínico de Obesidade Severa do Hospital das Clínicas da FMUSP, a chegada do Mounjaro vem de encontro à enorme expectativa em relação aos efeitos da tirzepatida para o controle da glicemia e perda de peso. “Os resultados de pesquisas científicas e do uso do remédio no dia a dia mostraram que ele tem uma alta eficácia para controlar a glicemia e proporcionar perda de peso. No consultório, tenho recebido muitos questionamentos de pacientes a respeito do Mounjaro para o emagrecimento”, ressalta.

Um conjunto de estudos, conhecido como programa SURPASS, feitos com 19 mil pessoas com diabetes tipo 2 no mundo, incluindo participantes no Brasil, apontaram, nos exames que medem a hemoglobina glicada, que pacientes portadores de diabetes que usaram o Mounjaro apresentaram índices próximos de quem não tem a doença. Já outras pesquisas, que foram em busca de entender a relação do medicamento com a obesidade, demonstraram que a caneta de tirzepatida é segura para promover a perda de peso corporal, além de viabilizar uma porcentagem maior em relação ao Ozempic – 22% ante 14%, de acordo com um estudo feito pela americana Eli Lily, fabricante do Mounjaro.

Alessandra ressalta que uma das grandes preocupações é que o Mounjaro seja visto como uma fórmula milagrosa de emagrecimento, cuja mensagem é impulsionada pelas redes sociais. “É importante que o uso do medicamento, assim como qualquer outra caneta de tratamento para diabetes indicada como opção off label para a perda de peso, seja acompanhado por orientação médica, pois o paciente pode não alcançar o efeito esperado, enfrentar percalços em sua jornada, incluindo efeitos colaterais severos, e, ao final, não ter um resultado satisfatório,, com risco de reganho de peso após a interrupção do uso”.

O Mounjaro será disponibilizado em seis versões, cujas dosagens partem de 2,5 mg e chegam a 15 mg de tirzepatida, possibilitando que o tratamento seja personalizado para cada caso. O valor mensal custará a partir de R$ 1400, válido para pacientes inscritos no Programa de Suporte ao Paciente da Lilly.

Duplo agonista

De acordo com a diretora clínica da Atma Soma, a tirzepatida é a primeira medicação da história que se encaixa na classe de duplos agonistas. “Enquanto a semaglutida imita a ação do hormônio GLP-1 (peptídeo-1 semelhante ao glucagon), para equilibrar as taxas de açúcar no sangue e regular o apetite, a tirzepatida imita o GLP-1 e o GIP (peptídeo insulinotrópico dependente de glicose), que também controla a glicemia e induz a sensação de saciedade”, ressalta.

O novo remédio se liga aos receptores de ambos os hormônios, envolvendo duas etapas. A primeira engloba a liberação de insulina, hormônio produzido pelo pâncreas responsável por retirar da circulação sanguínea o açúcar originado dos alimentos e colocá-lo dentro das células, quando será usado como fonte de energia. “Pacientes portadores de diabetes têm dificuldade de produzir a insulina ou ter sua ação efetiva no organismo. Nesse sentido, a glicose fica acumulada no sangue e ocasiona vários problemas de saúde, de ordem cardiorrespiratória, renal ou ocular”, explica a endocrinologista.

Já a segunda etapa de ação do Mounjaro aborda o controle de apetite. “Os receptores de GIP e GLP-1 também estão presentes em várias regiões do cérebro, relacionadas ao controle do apetite, da saciedade e do gasto energético. Com isso, o medicamento ajuda a regular os centros de recompensa que nos motiva a buscar o que dá prazer e assim melhora o comportamento alimentar, o que pode levar à perda de peso”, ressalta Alessandra.

Doenças crônicas em evolução

A chegada do Mounjaro ao mercado brasileiro é mais um capítulo importante para promover novos horizontes de combate ao avanço da diabetes e obesidade. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), o país possui cerca de 20 milhões de pessoas portadoras da doença, o que corresponde a mais de 10% da população, e com projeções de crescimento de novos casos para os próximos anos.

Em relação à obesidade, o quadro é semelhante. Conforme dados da pesquisa Vigitel 2023, 24,3% dos adultos no Brasil são obesos – 1 a cada 4 no país. Até 2030, esse porcentual pode chegar a 30%, de acordo com o Atlas Mundial da Obesidade 2022.

Acessibilidade: o grande desafio

Além do lançamento do Mounjaro, o mercado vem se empenhando em novas opções de medicamentos para incrementar o leque de opções disponíveis para os brasileiros. Por exemplo, a queda da patente da semaglutida está prevista para ocorrer em 2026 e existem laboratórios já trabalhando em versões genéricas do Ozempic. Há também anúncios sobre a produção de opções a base de liraglutida, princípio ativo do Saxenda, com foco em obesidade e diabetes.

Alessandra Rascovski aponta que ainda há um longo caminho de expansão do uso desses fármacos no Brasil. “O valor elevado ainda é um fator dificultador de democratização do acesso desses medicamentos para a população em geral, além deles não estarem disponíveis na rede pública de saúde. É preciso apostar em políticas públicas, com a adoção de tratamentos mais modernos no SUS, para que a maioria dos cidadãos tenha condições de utilizá-los tanto para o controle da diabetes quanto para a perda de peso”.

Outro aspecto mencionado por Alessandra é a importância do uso desses medicamentos para pacientes que não conseguem emagrecer somente com controle de alimentação e mudança de estilo de vida. “Vale lembrar que a obesidade, assim como a diabetes, é uma doença crônica recidivante, que muitas vezes não pode ser tratada somente com mudança de hábitos. Ainda precisamos evoluir muito nesse olhar, tirando a culpa do colo do paciente e entendendo que há outros fatores envolvidos, sendo a medicação uma importante aliada para ajudar na perda de peso”, conclui.

*Informações Assessoria de Imprensa