O Brasil registra, atualmente, mais de 575 mil médicos ativos, uma proporção de 2,81 profissionais por mil habitantes, a maior já registrada no país, segundo dados da Demografia Médica CFM, no relatório oficial sobre o perfil dos médicos brasileiros em 2024. Com a crescente desses profissionais, saúde mental precisa ser falado. Após cinco anos da pandemia de COVID-19, que não apenas expôs as fragilidades do sistema, mas também evidenciou algo frequentemente negligenciado, o esgotamento emocional dos profissionais. Médicos, enfermeiros, técnicos e outros trabalhadores da linha de frente enfrentaram uma pressão que ultrapassa o físico, deixando marcas profundas e duradouras no emocional.
Por muito tempo, os profissionais de saúde foram vistos — e muitas vezes se viam — como invencíveis, prontos para qualquer sacrifício. Mas essa expectativa é desumana. Ninguém escapa ileso de jornadas exaustivas, perdas constantes de pacientes, escassez de recursos e a sensação de impotência. A pandemia, ao invés de ser apenas uma crise pontual, acabou funcionando como uma lente de aumento para os problemas estruturais que sempre existiram.
Uma pesquisa realizada pela FAPESP apontam que até 86% desses profissionais sofreram com burnout e 81% apresentaram altos níveis de estresse, refletindo a sobrecarga emocional enfrentada no ambiente de trabalho. A rotina extenuante de plantões e sobrecarga cria um ciclo de desgaste contínuo, no qual o autocuidado se torna uma prioridade inalcançável. Atividades que poderiam aliviar o estresse — como exercício físico, lazer ou terapia — acabam sendo sacrificadas diante das exigências profissionais.
Felizmente, nos últimos anos, novas abordagens têm surgido para apoiar esses profissionais, e a tecnologia desempenha um papel central nesse processo. Plataformas de suporte emocional, por exemplo, têm facilitado o acesso a recursos de saúde mental de forma acessível e anônima. Assistentes virtuais e soluções de terapia online são ferramentas que permitem suporte contínuo, especialmente em momentos críticos de exaustão. Essas inovações, no entanto, não substituem o atendimento psicológico presencial, que ainda é fundamental para os casos mais graves. O que oferecem é um suporte inicial, acessível a qualquer momento, que pode ajudar a reconhecer sinais e buscar ajuda antes que os sintomas se agravem.
Contudo, apenas apostar na tecnologia não é suficiente. O verdadeiro problema é estrutural. Os profissionais não adoecem apenas por causa do trabalho intenso, mas porque trabalham em ambientes que muitas vezes não oferecem condições necessárias para seu bem-estar. É preciso transformar a forma como os ambientes de trabalho são organizados, reduzindo jornadas excessivas e oferecendo espaços onde o bem-estar seja uma prioridade real, e não apenas uma pauta discursiva.
A cultura de silêncio e o estigma que ainda cercam os problemas de saúde mental precisam ser enfrentados. Muitos profissionais não buscam ajuda por medo de serem julgados ou vistos como fracos. Criar uma cultura de acolhimento e empatia dentro das instituições é tão importante quanto oferecer recursos práticos de suporte. Cuidar dos profissionais de saúde não é apenas uma questão individual, mas uma necessidade que afeta diretamente a qualidade do atendimento prestado à população. Um profissional emocionalmente esgotado não pode oferecer o melhor cuidado possível aos seus pacientes. Cuidar de quem cuida é um passo essencial para garantir um sistema mais humano e eficiente.
*Diego Silva é fundador e CEO da Inner Health
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