O cuidado com pensamentos e comportamentos antissexistas pode evitar a violência de gênero

Recentemente, perdemos Bell Hooks, aclamada intelectual americana, teórica feminista, crítica cultural, artista e escritora. Uma mulher que fez o seu papel e deixou um legado importantíssimo em relação ao feminismo, à defesa de direitos das mulheres e, especialmente, em relação ao feminismo negro. Bell defendeu, dentre tantas questões, que as diferenças e as consequências delas decorrentes, no que se refere ao preconceito de gênero e à violência contra mulheres, podem ser mitigadas com educação e com amor.

“(…) precisamos saber mais sobre maternagem e paternagem feministas, sobre como, na prática, podemos criar as crianças em ambientes antissexistas e, o mais importante, precisamos saber mais sobre que tipo de pessoas as crianças educadas nesses lares se tornam.” (HOOKS, p. 114, 2020)

Partindo dessa premissa, portanto, vem a reflexão sobre como avaliamos e como (e se) pensamos sobre as gerações futuras, as gerações de nossos filhos e netos, sobre como nossas ações e a forma como criamos nossas crianças podem impactar no comportamento dessas próximas gerações.

No exercício da maternagem e da paternagem, é necessário oferecer uma educação em ambientes livres de comportamentos padrão, vinculados à manutenção de preconceitos de gênero, contextos que estabeleçam como verdade não a divisão injusta de papéis, mas a realidade do comprometimento e da responsabilidade de ambos os pais, o que requer, sem dúvidas, o envolvimento maior dos homens com o papel de pai, a sua participação igual na criação dos filhos.

Parece singelo, mas seria uma grande revolução a efetiva divisão de tarefas domésticas e com a criação dos filhos entre homens e mulheres, principalmente quando tratamos de casais heteroafetivos. A retirada definitiva do termo “ajuda” do vocabulário da família e o exercício genuíno da colaboração, da parceria e do comprometimento com tais atividades, num movimento proativo.

Nesse contexto, o exemplo seria o ponto de partida para que crianças cresçam com a exata noção de igualdade, já que a família é a sua primeira comunidade, a sua convivência inicial para a vida em sociedade. E esse exemplo seria adotado como o padrão para todas as demais comunidades e, consequentemente, para a vida.

A estrutura familiar de convivência colaborativa e igualitária proporcionaria a ideia de respeito pelos pares, pelos iguais, enfim, de respeito pelo outro, independente do gênero, seria iluminada a ideia de que todos são potência e que realizam o que quiserem, onde quiserem. Além de oferecer o desenvolvimento de uma autoestima mais saudável.

Enfim, a ideia a ser concretizada é a de que o casamento, em especial, não é um meio para a realização da maternidade para a mulher e o propósito de realização do homem como provedor, mas é sim, ou pode ser, um relacionamento de iguais, com ou sem filhos, ambos com suas profissões e a vontade de se realizar tanto neste contexto de pares como individualmente.

E ainda, mesmo que fora desse desenho padrão do relacionamento entre homens e mulheres, ou seja, ainda que as crianças sejam criadas apenas pela mãe ou pelo pai, pelos avós, por dois pais ou duas mães, seja em que formato for de família, essa ideia de paridade é importante e deve ser cultivada e vivida. É possível.

É significativo demonstrar que todos temos direitos, todos somos capazes e que não há limites para realizar dentro das circunstâncias do bem, que não há hierarquia entre seres humanos, o servir é para todos e o receber também. Como resultado só poderemos ter uma sociedade mais colaborativa, sem sobrecarga para uns e privilégios para outros, e principalmente, sem a cobrança violenta pelo ser servido, em todos os sentidos.

 

* Em caso de necessidade própria ou de outra mulher que esteja passando por qualquer tipo de violência, entre em contato com a Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180.

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p class=”ql-align-justify ql-indent-1″>Este é um canal de atendimento telefônico, com foco no acolhimento, na orientação e no encaminhamento para os diversos serviços da Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres em todo o Brasil. As ligações para o número 180 podem ser feitas de qualquer aparelho telefônico, móvel (celular) ou fixo, particular ou público. O serviço funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana, aos finais de semana e feriados inclusive.

* Viviane Teles de Magalhães Araújo é advogada com atuação no mercado corporativo nas áreas cível e trabalhista; Mestra em Direito (Direitos Fundamentais Coletivos e Difusos), Especialista em Direitos Humanos e Questão Social, MBA em Direito Empresarial, Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Autora do livro “Mulheres – Iguais na Diferença” e do artigo “A igualdade de direitos entre os gêneros e os limites impostos pelo mercado de trabalho à ascensão profissional das mulheres”, além de colunista do Saúde Debate

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