Trabalho no ramo de planos de saúde há quase 20 anos.
Algumas semanas antes de escolher o tema desta coluna, recebi um convite da Agência Nacional de Saúde Suplementar para participar do 2º Seminário ANS Digital. Baixei a grade de programação do evento e o tema de uma das oficinas chamou imediatamente a minha atenção: “Navegando no oceano da incerteza”. Achei tão oportuno!
Desde que comecei a colaborar com o portal Saúde Debate (e me sinto imensamente privilegiada por isso), sempre busco extrair da natureza motivação para os dias difíceis e outros percalços da vida que requerem de nós uma dose extra de foco e coragem para seguir em frente.
Em 2020, logo após a explosão dos números da covid-19 no Brasil, para espanto de muitos, as medidas de distanciamento social acarretaram no fechamento dos parques estaduais paranaenses, santuários da prática do montanhismo e outras atividades outdoor.
Não é muito difícil deduzir o motivo. Com o fechamento do comércio e a impossibilidade de aglomerar dentro dos limites da cidade, as pessoas redescobriram algo chamado “natureza” e para lá debandaram … em massa. Com isso, vieram os decretos e os parques foram fechados. Nesse momento, me senti, de fato, aprisionada, pois, até então, era para lá que corria quando precisava respirar um pouco.
Durante alguns meses trabalhando em regime 100% home office, o quintal de casa passou a ser meu único contato com o mundo exterior e poder olhar o céu com o rosto descoberto, um exercício diário e um lembrete de quão preciosa é a liberdade. Senti saudade de andar dias inteiros e de ver o mundo lá do alto. Como não adiantava reclamar, entrei em “modo de sobrevivência” e meu objetivo supremo passou a ser viver um dia de cada vez até esse caos acabar. Mas, com o passar dos dias, a falta de contato físico com a natureza começou a causar um grande desconforto emocional, traduzido em insônia e crises gástricas. Eu queria sair por aí sem destino e andar por alguma estrada de chão até não ter mais forças. Sentia muita energia acumulada dentro de mim e precisava extravasar de alguma forma.
Uma frase me serviu de inspiração: “Se formos livres por dentro, nada nos aprisionará por fora.”
Deste momento em diante, coloquei a minha saúde mental como prioridade. Só não sabia exatamente aonde isso me levaria e que estratégias adotaria para canalizar toda essa energia em alguma atividade que me colocasse em movimento sem me expor desnecessariamente. Foi quando conheci o skateboarding ou surf de asfalto, esporte criado na década de 50 por surfistas californianos que incrementaram dois pares de rodas de patins em uma prancha similar à de surf, mas, menor, para praticar a “navegação” em dias de maré baixa e poucas ondas.
Minha primeira experiência, foi com o modelo mini cruiser, mas logo percebi que era pequeno demais para meu porte. Eu mal conseguia permanecer em pé em cima dele em movimento, pois, além do tamanho, o shape é muito flexível. Pouco tempo depois, comprei um shape três vezes maior, mais estável, com rodas macias, largas e aderentes, para prática de longboard. Logo me identifiquei, pois é o tipo de skate que permite movimentos mais amplos, proporcionando uma experiência única ao deslizar sobre o asfalto. E como na natureza tudo se transforma, o shape do cruiser atualmente está fixado em um tronco de árvore enfeitando o quintal de casa.
O skate é um esporte arriscado, como aprendi logo nos primeiros treinos, depois de um pequeno acidente em que, obviamente, não estava usando o equipamento de segurança, capacete, joelheiras e luvas, e ganhei uma bela cicatriz no braço. Por sorte, os amigos que me acompanhavam na peripécia juntaram meus cacos na estrada antiga da Graciosa e me trouxeram para casa. Mas, não desisti no primeiro tombo. Pelo contrário, após o longo e doloroso processo de consolidação das fraturas, fiquei mais prudente.
A sensação de me equilibrar em uma prancha em velocidade e, ao mesmo tempo, poder observar a paisagem e sentir a brisa gelada no rosto, me transportam para outra dimensão. Me sinto livre e disposta a superar qualquer desafio, em qualquer fase da vida. Minhas remadas ainda não são tão firmes como eu gostaria e estão longe de ser seguras, mas já consigo sair do lugar e sei que posso progredir.
Passados os meses mais tenebrosos da pandemia, assim espero, sempre que posso, pego meu já surrado skate e procuro alguma rua bem pavimentada com declive suave, apenas para sentir o vento no rosto e a adrenalina. É um momento de “costuras”, onde consigo alinhavar meus pensamentos, alinhar meu corpo e refletir sobre a vida, sobre meus anseios e esperanças.
Desde que fomos atingidos por aquela grande onda a cerca de dois anos, sinto que vivemos um tempo especial e solene. Tempo de reflexão e preparo para os novos e grandes desafios que certamente virão. A pandemia nos deixou mais fortes? Não sei. Mas nos deixou mais atentos e conscientes, eu acredito. O mar ainda está agitado e navegamos num oceano de incertezas, mas estamos aprendendo a remar.
Enquanto aprendemos a nos manter na superfície desse mar agitado, desafio você a se reinventar diariamente, mesmo quando as circunstancias não forem favoráveis. Cuide de seu corpo e de sua mente e lembre que seus pensamentos podem elevar ou deprimir, dependendo do tipo de sentimento que você cultiva. E não esqueça de descansar. Nós, os que ficamos por aqui, ainda temos muito trabalho a fazer, por nós, pela nossa família e pelo mundo. Podemos inspirar pessoas e compartilhar experiências, prestando apoio emocional ou nos dedicando a alguma causa. Viva com propósito. Peça sabedoria a Deus; Ele acalma o mar! Cuide-se e cuide do nosso planeta, pois só temos ele.
Explore, sonhe, descubra! (Foto: Acervo pessoal)
Até breve, pessoal.
*Cris Pereira é graduada em Psicologia pela Universidade Tuiuti do Paraná e atua na área de regulação dos planos privados de saúde desde 2002. É praticante frequente de trekking de aventura há quase três décadas, além de amante de viagens, natureza e fotografia. Neste espaço, compartilha dicas, relatos e impressões de suas aventuras.
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