Médicos psiquiatras e outros especialistas estão chamando atenção para mais um impacto da pandemia: a quarta onda da Covid-19, relacionada à saúde mental. São aspectos psiquiátricos da pandemia, que podem causar efeitos individuais e coletivos a curto, médio e longo prazo.
O fato de a saúde mental estar relacionada a uma quarta onda da pandemia não significa que ela ainda não tenha acontecido. Pelo contrário: a quarta onda começou junto com os primeiros casos diagnosticados de Covid-19. É uma forma de descrever etapas de uma pandemia, como a mortalidade (primeira onda), impacto da restrição de recursos para outros pacientes (segunda onda) e impacto da interrupção dos cuidados com os pacientes crônicos (terceira onda).
O alerta sobre a quarta onda, a onda das doenças mentais, está sendo feito desde março. “Sabíamos que as doenças emocionais tanto durante a pandemia quanto pós seriam avassaladoras”, afirma o médico psiquiatra Júlio Dutra, presidente da Associação Paranaense de Psiquiatria-APPSIQ.
Ainda não existem dados epidemiológicos precisos sobre as implicações psiquiátricas relacionadas à Covid-19 ou seu impacto na saúde pública. No entanto, especialistas e dados obtidos até o momento indicam um aumento substancial na procura por atendimentos psiquiátricos e psicológicos.
“Em uma pandemia, as implicações psicológicas e psiquiátricas secundárias ao fenômeno, tanto em nível individual quanto coletivo, tendem a ser subestimadas e negligenciadas, gerando lacunas nas estratégias de enfrentamento e aumentando a carga de doenças associadas”, comenta Dutra.
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Explicações do impacto da pandemia na saúde mental: quarta onda
De acordo com ele, os impactos da pandemia na saúde mental e a chamada quarta onda são explicados por uma série de fatores, como as incertezas geradas por uma nova situação; a insegurança econômica; as informações duvidosas e falsas; e as restrições sociais.
“Todo o processo da pandemia, incluindo o isolamento dentro de casa, desperta ansiedade, medo e insegurança. Como consequência pode levar a quadros de pânico e depressão. Em uma pandemia, o medo aumenta os níveis de ansiedade e estresse em indivíduos saudáveis e intensifica os sintomas daqueles com predisposição a desenvolver desordens psiquiátricas existentes”, esclarece.
Além disso, existe uma série de implicações que pode gerar impactos além da saúde mental. Dutra lembra das crianças, que estão em maior contato com possíveis abusadores, que na maioria das vezes fazem parte da própria família; dos idosos, que se tornam ainda mais vítimas de assediadores e exploradores; e das mulheres, que ficam mais vulneráveis à violência doméstica.
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p class=”ql-align-center”>Julio Dutra, presidente da Associação Paranaense de Psiquiatria (Foto: Reprodução)
Pandemia dentro da pandemia: quarta onda da Covid-19 e a saúde mental
Estudos mostram que, durante as epidemias, o número de pessoas cuja saúde mental é afetada tende a ser maior do que as pessoas atingidas pela infecção propriamente dita. Isto porque as incertezas e o medo, inclusive de contaminação, atacam os infectados e todos a sua volta, gerando impactos psicossociais e econômicos incalculáveis. “Em alguns casos, a incerteza sobre infecção e morte ou sobre a infecção de familiares e amigos pode potencializar estados mentais disfóricos”, conta Júlio Dutra. Além disso, as implicações na saúde mental podem durar mais tempo e ter maior prevalência do que a própria epidemia, segundo o especialista.
O presidente da Associação Paranaense de Psiquiatria acredita que, apesar de uma observação pela maior procura por atendimentos psiquiátricos ou psicológicos, há uma tendência de as doenças psiquiátricas vinculadas à quarta onda aumentarem. Ele cita como exemplos os casos de depressão; transtornos de humor e ansiedade (incluindo ataques de pânico e estresse pós-traumático); e sintomas psicóticos ou paranóicos, que podem, inclusive, levar ao suicídio.
“Mesmo entre pacientes com sintomas comuns de gripe, o estresse e o medo devido à semelhança das condições podem gerar sofrimento mental e piorar os sintomas psiquiátricos, e essas implicações psiquiátricas podem ser significativamente altas, sobrecarregando os serviços de emergência e o sistema de saúde como um todo”, revela Dutra.
Impactos da pandemia: estratégias e ações preventivas e emergenciais
Para o presidente da APPSIQ, pensar em práticas públicas de saúde mental se torna mais do que essencial. Isso passa também pelo aumento no investimento em pesquisas e ações imediatas nessa área paralelamente ao surto infeccioso.
Dutra sugere como estratégias a formação e disponibilização de equipes multidisciplinares de saúde mental (incluindo psiquiatras, enfermeiros psiquiátricos, psicólogos clínicos e outros profissionais de saúde mental); e a comunicação clara envolvendo atualizações regulares e precisas sobre a pandemia de Covid-19, levando conhecimento sobre saúde mental a todos os profissionais da saúde. “E estabelecimentos de serviços seguros de atendimentos psicológicos e psiquiátricos, com aumento e implantação de ambulatórios especializados para atender essa demanda, que só tende a crescer”, enfatiza.
De acordo com ele, as políticas públicas em saúde mental devem estar associadas com as respostas à pandemia em todas as suas fases: antes, durante e após o evento.
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