Estudos do ICB-USP desvendam novos mecanismos de proteção cerebral na hipertensão através do exercício físico

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(Foto: Freepik)

Pesquisadores do Departamento de Fisiologia e Biofísica do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), liderados pela professora Lisete Compagno Michelini, alcançaram avanços inéditos na compreensão dos mecanismos pelos quais o exercício físico é benéfico ao funcionamento da barreira hematoencefálica (BHE) — uma estrutura essencial que protege o cérebro de substâncias circulantes nocivas ao sistema nervoso central e contribui para prevenir danos relacionados à elevada variabilidade da pressão arterial, como AVCs e complicações em órgãos vitais, incluindo coração e rins.

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O estudo, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e realizado ao longo de cinco anos, demonstrou em hipertensos que o treinamento aeróbio além de reduzir o transporte de vesículas transcelulares, também fortalece as junções oclusivas da BHE, aumentando sua resistência e seletividade. Além disso, os cientistas identificaram que o exercício reduz a reatividade da micróglia (células de defesa do sistema nervoso central que atuam como “macrófagos residentes”) que ao sintetizar mediadores inflamatórios críticos prejudicam o funcionamento da barreira.

Esses achados inéditos representam um avanço significativo em um campo de pesquisa que vem sendo explorado pelo grupo há anos. Estudos anteriores já haviam demonstrado que o exercício aeróbico não apenas reduz a pressão arterial, mas também estabiliza sua variabilidade, protegendo órgãos como cérebro, coração e rins dos danos causados pela hipertensão. Além disso, foi comprovado que o treinamento físico reduz a elevada permeabilidade da BHE tanto na hipertensão crônica quanto na insuficiência cardíaca, restaurando a homeostase cerebral mesmo na persistência da doença.

A BHE, localizada nos capilares cerebrais, age como um filtro seletivo entre o sangue e o cérebro, impedindo a entrada de substâncias tóxicas e macromoléculas, incluindo hormônios plasmáticos como a angiotensina II. Em excesso, este hormônio atravessa a barreira devido ao aumento de sua permeabilidade, desregulando o controle autonômico da circulação e agravando oscilações da pressão arterial, com impactos severos ao cérebro, coração e rins.

Junções oclusivas mais resistentes e micróglia modulada

As células endoteliais que formam que formam a BHE nos capilares encefálicos são conectadas por junções oclusivas que limitam a passagem de substâncias hidrossolúveis entre o sangue e o cérebro. Um novo estudo do grupo revelou que o treinamento físico aumenta a densidade e a resistência dessas junções, reduzindo o acesso de substâncias prejudiciais ao cérebro. “Essa descoberta mostra como o exercício físico vai além do controle dos níveis pressóricos, aumentando a seletividade da BHE e restaurando o controle autonômico da circulação”, explica Michelini.

Paralelamente, os pesquisadores demonstraram que o exercício reduz a reatividade da microglia, células fundamentais para a defesa e integridade do sistema nervoso central, reduzindo processos inflamatórios associados à hipertensão. Também este mecanismo contribui para preservar a funcionalidade da BHE e proteger o cérebro de danos decorrentes da doença.

Impactos na hipertensão secundária

Embora estudos anteriores tenham se concentrado na hipertensão primária e insuficiência cardíaca, o grupo também explorou, pela primeira vez, os efeitos do exercício físico sobre a permeabilidade da BHE na hipertensão secundária, frequentemente causada por problemas renais. Resultados preliminares indicam que o treinamento físico é capaz de corrigir déficits severos da BHE como o aumento exacerbado da formação de vesículas transcelulares e a redução da expressão da claudina-5, principal proteína responsável pela seletividade das junções oclusivas, os quais determinam a elevada permeabilidade da barreira na hipertensão de origem renal.

Reconhecimento internacional e relevância clínica

Desde seu início, em 2019, o projeto temático recebeu diversas premiações, incluindo o “Paul Dudley White International Scholar Award for the highest ranked abstract at the Hypertension Scientific Sessions 2021”, para doutoranda Vanessa B. Candido e o título de pesquisadora revelação da International Society of Hypertension, concedido à pós-doutoranda Hiviny de Ataídes Raquel. O estudo também resultou em várias publicações de destaque como a seleção de um artigo para o “APSselect november 2021” da American Physiological Society e outro como capa da revista Clinical Science em 2023. “Essas descobertas revelam mecanismos inéditos que ampliam nossa compreensão sobre os benefícios do exercício físico para a funcionalidade da BHE e a homeostase cerebral, reforçando seu papel como estratégia complementar no tratamento da hipertensão arterial”, conclui Michelini.

*Informações Assessoria de Imprensa