O Paraná registrou 222 casos de hanseníase em 2021, sendo que 80% eram graves, revela o Boletim Epidemiológico de Hanseníase divulgado pelo Ministério da Saúde. Ainda de acordo com o órgão, o estado teve 1855 novos casos de tuberculose. Embora sejam muito conhecidas, a hanseníase e a tuberculose persistem como graves problemas de saúde pública no Brasil. Ambas fazem parte das denominadas doenças negligenciadas: enfermidades predominantes em áreas tropicais e subtropicais (África, Ásia e América Latina) que afetam principalmente comunidades empobrecidas, com maior incidência em mulheres e crianças de cerca de 150 países.
Entre elas estão a malária, a doença de Chagas, a doença do sono, a leishmaniose e a esquistossomose. São doenças tratáveis e curáveis que não despertam tanto o interesse dos governos e da indústria farmacêutica e recebem investimentos reduzidos em pesquisas, controle e produção de medicamentos. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), os impactos desse descaso são devastadores para 1,7 bilhão de pessoas em todo o mundo.
Leia também – Indústria produz teste rápido para Hanseníase
Dados da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) revelam que, entre janeiro de 2012 e setembro de 2018, 256 novos fármacos chegaram ao mercado, mas apenas oito (3,1%) foram direcionados às doenças negligenciadas. Com o intuito de oferecer um tratamento precoce e apropriado aos pacientes, o ID8 – Inovação em Diagnóstico, laboratório focado no diagnóstico molecular com entrega rápida, desenvolveu exames específicos para a hanseníase e a tuberculose.
“O exame molecular para tuberculose analisa o material genético do Mycobacterium tuberculosis em amostra de secreção pulmonar. Ele é baseado nas metodologias de PCR e DNA Strip e detecta se a bactéria presente no organismo é resistente aos principais medicamentos utilizados no tratamento da doença. Já, no caso da hanseníase, é realizada a detecção de resistência às drogas de primeira e segunda linha (Rifampicina, Fluoroquinolonas e Dapsona)”, afirma Rodrigo Chitolina, supervisor de laboratório e responsável técnico do ID8.
Hanseníase pode gerar danos irreversíveis
Causada pela bactéria Mycobacterium leprae, a hanseníase é uma das doenças mais antigas da humanidade. É uma patologia infecciosa, transmissível, de caráter crônico e atinge principalmente os nervos periféricos, os olhos e a pele. Caso o diagnóstico ocorra tardiamente ou o tratamento seja inadequado, a hanseníase pode provocar lesões neurais e danos irreversíveis, como deformidades e incapacidades físicas.
A hanseníase é uma doença de notificação compulsória em todo o território nacional e de investigação obrigatória em todos os estados, que possuem uma coordenação para o controle da doença. De acordo com a Dra. Laila de Laguiche, dermatologista e presidente do Instituto Aliança Contra Hanseníase (AAL, na sigla em inglês – Alliance Against Leprosy), um dos principais entraves para o diagnóstico precoce da doença é que os sintomas iniciais são, muitas vezes, imperceptíveis: “É uma doença dermato-neurológica, muitas pessoas esperam as lesões aparecerem para realizar o diagnóstico, mas os principais sintomas estão ligados aos nervos, como a perda de pêlos e da diminuição da sudorese”.
A patologia também apresenta um longo período de incubação, isto é, o tempo em que os sinais e sintomas se manifestam desde a infecção. Esse período possui em média a duração de dois a cinco anos, mas pode ser maior, dificultando ainda mais o controle da doença. Além da perda de pêlos e da redução de sudorese, os sintomas englobam a diminuição da sensibilidade (hipoestesia), nariz com crosta, obstrução e sangramento, lesões da cor da pele, manchas hipocrômicas, diminuição da força, caroços e placas em qualquer local do corpo e sensação de formigamento, fisgadas ou dormência nas extremidades.
O diagnóstico é feito por exames clínicos e pela baciloscopia, que utiliza raspados dérmicos de joelhos, cotovelos e lóbulos da orelha (regiões com maior presença do bacilo) ou de lesões da pele. Disponibilizado de forma gratuita no Sistema Único de Saúde (SUS), o tratamento é realizado com poliquimioterapia única (PQT-U) e envolve três fármacos: rifampicina, dapsona e clofazimina. Segundo Laila, o tratamento dura de seis a 12 meses e, após 15 dias, a transmissão da patologia é interrompida. “Raramente a Hanseníase leva a óbito, mas cerca de 54% dos doentes no Brasil terminam o tratamento com sequelas nos membros e olhos, levando a um grande custo para o sistema de aposentadoria e pensão no país”, enfatiza a fundadora da Aliança contra Hanseníase.
Primeiro teste comercial foi lançado em 2021
A empresa Mobius Life Science, localizada no Paraná, lançou, no último ano, o DNA Strip Hain Lifescience, primeiro teste comercial brasileiro que permite avaliar o perfil de resistência aos fármacos do tratamento da Hanseníase. O material, que representa um grande avanço para a hansenologia no Brasil e já está registrado pela ANVISA, também recebeu corroboração da diretoria científica do Instituto Aliança contra Hanseníase.
O teste utiliza técnicas de biologia molecular para detecção das resistências medicamentosas do Mycobacterium leprae (bactéria causadora da hanseníase). É baseado na tecnologia de PCR e DNA-STRIP, em que a detecção é realizada a partir de uma biópsia de pele positiva para o patógeno. Outro ponto importante é de que o resultado de detecção de resistência medicamentosa é liberado em poucos dias, um prazo muito rápido se comparado ao prazo que pode ser de meses, quando as amostras são enviadas aos centros de pesquisa nacionais.
Estigma e exclusão social
A dermatologista explica que a hanseníase está relacionada a condições de vida precárias, mas existe também uma predisposição genética: “Assim como existem famílias com predisposição a diabetes, há também na hanseníase: 90% da espécie humana é imune à bactéria da hanseníase, mas esses 10% das pessoas suscetíveis a ela geralmente são famílias que se isolam devido ao preconceito com a doença. As pessoas que têm hanseníase nem chegam a se consultar porque moram em regiões rurais e sem acesso a tratamentos. O papel dos agentes comunitários é muito importante nesse sentido de confirmar os casos suspeitos. Os médicos estão perdendo a capacidade de diagnosticar a hanseníase”.
O estigma em torno da doença se desenvolveu ao longo de muitos anos, gerando discriminação e exclusão social. Trata-se de mais um obstáculo para o combate à doença. “As doenças negligenciadas não recebem atenção dos cientistas e da indústria farmacêutica. Nós temos a mesma terapia desde a década de 80, a poliquimioterapia, os mesmos antibióticos para tratar a bactéria há 40 anos”, salienta Laila.
Tuberculose
Embora não esteja na lista oficial da OMS sobre o tema, a tuberculose também é considerada uma patologia negligenciada pelo G-Finder, projeto financiado pela Fundação Bill & Melinda Gates e dedicado a problemas de saúde que atingem as populações mais pobres do mundo.
A tuberculose é uma das doenças infecciosas de alta transmissibilidade. Um indivíduo com tuberculose infecta, em média, de 10 a 15 pessoas. Diagnosticá-la precocemente é fundamental para evitar complicações, sequelas e a continuidade da cadeia de transmissão.
A doença é causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis, que afeta com mais frequência os pulmões, mas pode infectar qualquer parte do corpo, incluindo o sistema nervoso. “A maioria das pessoas expostas à bactéria da tuberculose nunca desenvolveu a doença porque esta bactéria pode viver na forma inativa dentro do corpo. Caso o sistema imunológico de defesa venha a enfraquecer (pessoas vivendo com HIV/AIDS, idosos, diabéticos, câncer, uso de corticoide, doenças autoimunes, lúpus, bebês e crianças pequenas, desnutrição, pessoas vivendo na linha da pobreza), a bactéria pode desenvolver a doença ativa e contagiosa”, esclarece Marta Fragoso, infectologista do Hospital Vita.
Os sintomas caracterizam-se por tosse persistente (por mais de duas semanas) produtiva (com escarro e às vezes com sangue), febre, suores noturnos, perda de peso, dor no peito e cansaço. A contaminação ocorre pela aspiração das gotículas presentes no ar transmitidas pela tosse, fala ou espirros do portador da bactéria da tuberculose ativa. A concentração da bactéria é maior em ambientes fechados e sem ventilação aumentando o risco de contaminação.
Abandono de tratamento pode provocar óbitos
“A tuberculose é frequentemente vista como uma doença do passado, no entanto é uma das doenças infecciosas de alta transmissibilidade de maior problema de saúde pública do mundo, principalmente nos países de média e baixa renda. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, em 2019 mais de 10 milhões de pessoas desenvolveram a doença e 1,5 milhão morreram no mundo, entre elas, 1,1 milhão de crianças. Por ser predominante em países de média e baixa renda acaba sendo uma doença negligenciada. Ao todo, 30 países de baixa e média renda concentram mais de 80% dos casos globais”, destaca a infectologista.
Já o diagnóstico envolve a suspeita clínica e a confirmação por meio da pesquisa da bactéria no escarro via exame laboratorial. “É muito importante que os profissionais de saúde estejam atentos para a possibilidade deste diagnóstico para isolar o doente imediatamente e solicitar a pesquisa da bactéria no escarro. É o diagnóstico precoce, o isolamento do doente até não estar mais transmitindo a doença e o início rápido do tratamento que proporcionam o controle da disseminação da tuberculose”, complementa Marta.
O tratamento dura, no mínimo, seis meses e consiste na utilização de antibióticos (rifampicina, isoniazida, pirazinamida, etambutol), mas um dos grandes problemas para o controle da tuberculose é o abandono do tratamento ou sua inadequação, que podem gerar complicações posteriormente e até óbitos.
Em um cenário norteado pela complexidade do diagnóstico da hanseníase e da tuberculose e das graves consequências provocadas por ambas, os exames moleculares disponibilizados pelo ID8 representam uma grande contribuição para o combate das enfermidades.
“Dentro do ID8 Diagnóstico todos os exames são realizados usando metodologias de biologia molecular, padrão ouro para diagnóstico, devido a sua alta especificidade e sensibilidade”, aponta Chitolina.
Hoje apesar de as doenças negligenciadas, como a Hanseníase e a Tuberculose, apesar de terem tratamento disponibilizado de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ambos os tratamentos são longos, podendo levar até um ano, e quando iniciado segundo os protocolos padrões atuais, sem avaliação do perfil de resistência, pode não ser eficaz.
Para as doenças negligenciadas, tão importante quanto um diagnóstico rápido do patógeno, visando um isolamento precoce do paciente no caso da tuberculose, por exemplo, é saber qual o tratamento adequado para cada paciente.
“Infelizmente, já temos relatos de resistência medicamentosa, tanto do patógeno causador da Tuberculose quanto o da Hanseníase. Sendo assim, o ideal é que antes de se iniciar um tratamento, que é longo e muitas vezes desgastante ao paciente, seja realizada uma avaliação das resistências aos fármacos disponíveis. Tal avaliação vai permitir com que o médico escolha o medicamento adequado para cada paciente, evitando assim situações de inadequação ao tratamento, bem como o abandono”, destaca Rodrigo, do ID8.
Com isso, tendo um tratamento adequado e preciso, já na primeira abordagem medicamentosa, é possível evitar desde a disseminação e transmissão da doença, bem como evitar a evolução de casos graves que podem levar a sequelas e, dependendo, até mesmo a óbito.
*Informações Assessoria de Imprensa