Úlceras das extremidades inferiores são comumente causadas por insuficiência arterial (por exemplo, aterosclerose) e estase venosa. Também existe um tipo de úlcera isquêmica que ocorre exclusivamente no paciente hipertenso. Descritas pela primeira vez por Martorell, Hines e Farber na década de 1940, essas úlceras são definidas por: localização única nas extremidades inferiores, geralmente no terço inferior externo da perna, úlcera de forma arredondada, de dois a 4cm de diâmetro, de base granulosa ou necrótica, ausência de calcificações arteriais; ausência de insuficiência venosa crônica; lesões simétricas ou hiperpigmentação residual de ulceração anterior na face interna do membro inferior; extremamente dolorosa – dor desproporcional ao tamanho da lesão – aumento da dor na posição horizontal, com predominância no sexo feminino, entre 50 e 60 anos, e sua associação com Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) grave de longa duração e mal controlada.(1)(2)(3)
Neste mês de setembro, em que celebramos o Dia Mundial do Coração (29/09), aproveito a oportunidade para abordar este importante tema.
Acredita-se que a patogênese da úlcera hipertensiva esteja relacionada a fatores locais da microvasculatura e não comprometimento de grandes vasos, como observado nas doenças vasculares periféricas mais comuns. O trauma pode ser um fator desencadeante, embora metade das úlceras surjam espontaneamente(3)
O diagnóstico geralmente é tardio e requer a exclusão de outras causas.(3) O diagnóstico é substancialmente feito por exclusão, dando peso à história clínica e aos sintomas. No entanto, é necessário realizar estudos Doppler e arteriográficos para excluir uma doença venosa e uma arteriopatia crônica obstrutiva de membros inferiores, que constituem a base dos critérios de diagnóstico de úlcera de Martorell.(4)
O processo de cura é lento e a resposta ao tratamento é pobre. O melhor tratamento para as úlceras hipertensivas isquêmicas ainda é controverso (2).
Os tratamentos propostos são a terapia anti-hipertensiva, especialmente com medicamentos que reduzem vasoconstrição, como bloqueadores dos canais de cálcio e inibidores da enzima de conversão da angiotensina(3). Enquanto os beta-bloqueadores devem ser evitados (2).
Pacifico et al. (4) em 2011 sugeriu o uso de prostaglandina E (PGE1). Novos relatórios mostram que a patogênese dessas lesões apresenta alta resistência vascular local com baixa pressão de perfusão da pele. Por esse motivo, os pacientes foram submetidos à terapia com PGE1 e obtiveram resultados bem-sucedidos. Por um complexo mecanismo de ação, esse fármaco leva a uma dilatação arterial e, dessa forma, melhora a baixa pressão de perfusão periférica, principal causa dessa doença(4).
Outros autores defendem a realização de simpatectomia lombar, e outros o tratamento conservador, com controle da PA e cuidados com a lesão, só recorrendo à simpatectomia e/ou enxertia em casos resistentes(2). Dor leve a moderada pode ser tratada com o uso de analgésicos comuns(3).
Atualmente, para úlceras refratárias ao tratamento convencional, a literatura tem documentado a utilização de oxigênoterapia hiperbárica como terapia adjuvante com melhora significativa no porcentual de resolução dessas lesões(5). Com relação ao tratamento local da úlcera, inclui desbridamento da ferida, controle da carga bacteriana, controle do exsudato e cuidados com as bordas e pele perilesional seguindo os princípios de cicatrização em ambiente úmido. Em casos de feridas extensas, o enxerto de pele seria indicado(2)(6).
* Michele N. Brajão Rocha é estomaterapeuta TiSobest, Mestre em Ciências pelo PROESA – EEUSP, Membro Pleno do WCET, Membro do Grupo de Pesquisas em Estomaterapia da EEUSP (GPET), Membro do Conselho Fiscal da SOBEST, Coordenadora de Serviços Clínicos da ConvaTec Medical Care.
Referências:
1. Graves JW, Morris JC, Sheps SG. Martorell ’ s hypertensive leg ulcer : case. 2001;279–83.
2. Freir BM, Fernandes NC, Piñeiro-Maceira J. Úlcera hipertensiva de Martorell: relato de caso. An Bras Dermatol. 2006;81(suppl 3):S327–31.
3. Pinto APFL, Silva NA, Osorio CT, Rivera LM, Carneiro S, Ramos-e-Silva M, et al. Martorell’s ulcer: Diagnostic and therapeutic challenge. Case Rep Dermatol. 2015;7:199–206.
4. Pacifico F, Acernese CA, Giacomo A Di, Pacifico F, Alberto AC, Giacomo D, et al. PGE 1 therapy for Martorell ’ s ulcer. 2011;8(2):140–4.
5. Silva RC de O e, Perpetuo M do CM de O, Miranda ES de. Oxigenoterapia hiperbárica no tratamento da úlcera de Martorell: Revisão da literatura e relato de três casos. Rev Med Minas Gerais. 2003;13(3):214–7.
6. Úlcera Hipertensiva ( Úlcera de Martorell ). 2018. Santiago de Compostela. Acesso em 14 de setembro de 2020. Visualizado em: https://ulcerasfora.sergas.gal/Informacion/%C3%9ALCERA-HIPERTENSIVA-(%C3%9ALCERA-DE-MARTORELL)-OU
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