Uma pesquisa da Fiocruz constatou que o medicamento Atazanavir, utilizado no tratamento do HIV, foi capaz de inibir a replicação viral, além de reduzir a produção de proteínas que estão ligadas ao processo inflamatório nos pulmões e, portanto, ao agravamento do quadro clínico da doença. Os especialistas também investigaram o uso combinado do atazanavir com o ritonavir, outro medicamento utilizado para combater o HIV.
O estudo foi publicado no dia 06 de abril na plataforma internacional BiorXiv, em formato de pré-print, seguindo a tendência do estudo e do reposicionamento de medicamentos no enfrentamento da emergência sanitária. “A análise de fármacos já aprovados para outros usos é a estratégia mais rápida que a Ciência pode fornecer para ajudar no combate à Covid-19, juntamente com a adoção dos protocolos de distanciamento social já em curso”, aponta Thiago Moreno, pesquisador da Fiocruz, que lidera a iniciativa.
O pesquisador ressalta que os medicamentos propostos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) estão mais próximos de se tornarem terapias para os pacientes com Covid-19. Ele observa que, no entanto, mais alternativas são necessárias, especialmente substâncias já em produção nacional e com perfil de segurança superior a algumas destas moléculas inicialmente propostas pela OMS. Reforça também o alerta sobre os riscos da automedicação, uma vez que cada paciente deve ser assistido por seu médico, que deverá acompanhar o tratamento, especialmente no caso de novas doenças e remédios reposicionados.
A pesquisa, coordenada pelo Centro de Desenvolvimento Tecnológico emSaúde (CDTS/Fiocruz), envolve cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) – incluindo os Laboratórios de Vírus Respiratórios e do Sarampo, de Imunofarmacologia, de Biologia Molecular e Doenças Endêmicas, e de Pesquisas sobre o Timo – e do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), além do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino e da Universidade Iguaçu.
Leia também – Como a Inteligência Artificial auxilia a saúde em tempos de coronavírusAMP
Modelagem molecular e testes com células
Considerando que trabalhos científicos anteriores já haviam apontado a protease viral ‘Mpro’ – uma enzima capaz de permitir que as proteínas do vírus sejam fabricadas corretamente – como um alvo central na busca de medicamentos para o novo coronavírus, os pesquisadores voltaram seus olhos para o potencial de uso do atazanavir.
Além de possuir ação sobre a Mpro, também existiam indícios da atuação da medicação sobre o trato respiratório, o que chamou a atenção dos cientistas na fase de seleção das substâncias a serem investigada.
Os pesquisadores realizaram três tipos de análises: observaram a interação molecular do atazanavir com a região específica de interesse do vírus Sars-CoV-2 (a Mpro), realizaram experimentos com esta enzima e testaram o medicamento in vitro, em células infectadas. Também foram realizados experimentos comparativos com a cloroquina, que vem sendo incluída em diversos estudos clínicos mundialmente, neste caso os resultados obtidos apenas com o atazanavir e em associação com o ritonavir foram melhores que os observados com a cloroquina o que motiva a equipe a avançar nestes estudos.
Do ponto de vista da produção nacional do medicamento, em um cenário de possível adoção como estratégia clínica, vale destacar que a produção nacional do insumo é realizada pelo Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz).
Leia também – Números do novo coronavírus no Brasil e no ParanáAMP
Leia também – Ferramenta online permite monitorar avanço da Covid-19 no BrasilAMP
Pesquisas com medicamentos não divulgados
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) está testando medicamentos que podem auxiliar no combate ao coronavírus. A organização vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) está procurando substâncias que possam ser usadas contra o vírus SARS-Cov-2. A pesquisa acontece em medicamentos já regulamentados no Brasil.
Segundo a pesquisadora Daniela Trivella, entre os dois mil medicamentos analisados na primeira etapa de testes, dois mostraram resultados promissores. O CNPEM não divulga quais são para evitar automedicação. Porém, de acordo com Daniela, ambas as substâncias têm várias características que podem permitir o uso contra a doença. “São economicamente acessíveis, bem tolerados em geral, comumente utilizados por pessoas dos mais diversos perfis e, um deles, inclusive, está disponível em formulação pediátrica”, enumerou.
Estão sendo avaliados medicamentos dos mais diversos tipos: analgésicos, anti-hipertensivos, antibióticos, diuréticos entre outros. A pesquisadora explica que os experimentos feitos em laboratório buscam identificar substâncias que inibam a replicação do vírus dentro do corpo. “Passo fundamental para impedir ou reduzir a infecção viral”, enfatiza.
A partir dos resultados obtidos até agora, as duas substâncias que obtiveram bom desempenho continuarão ser testadas em células para novas avaliações. “Acreditamos que em cerca de duas semanas teremos os resultados que devem anteceder os testes clínicos”, acrescenta Daniela. Será feito, então, um relatório que reunirá as informações colhidas em laboratório com aquilo que já se sabe sobre os efeitos desses medicamentos em seres humanos.
Esse documento vai embasar testes clínicos, em pessoas infectadas com o vírus, que podem ser feitos dentro da Rede Vírus, iniciativa do MCTIC que reúne centros de pesquisa que estão procurando formas de combater o coronavírus.