Com doença rara, estudante de medicina da UFPR cria canais para divulgar aprendizados

    Aos 21 anos, Larissa Lauzy Macedo Marques já tem um bocado de histórias para contar. Mas, diferentemente da maior parte dos jovens da sua idade, o filme da sua vida também tem hospitais e salas de cirurgia como cenários – no início, como paciente, e, desde 2018, como estudante do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

    Desde os quatro anos de idade ela frequenta hospitais. Até os 18 anos, passou por 14 cirurgias nas pernas, com longos processos de recuperação e reabilitação. A cada nova intervenção, a jovem precisava reaprender a andar. A causa de tudo isso pode ser resumida em três consoantes: XLH, ou, em termos médicos Raquitismo Hipofosfatêmico Ligado ao X, uma doença rara que ocupa horas da sua dedicação.

    Recentemente, ela criou uma conta no Instagram e outra no Facebook para divulgar informações e integrar portadores da doença. Em dezembro de 2019, lançou um canal no WhatsApp para falar de forma mais próxima com pessoas na mesma condição.

    Uma a cada 20 mil pessoas podem nascer com o XLH, doença que prejudica a absorção de cálcio e fósforo, agindo também nos rins. “A falta de fósforo leva a um defeito da mineralização óssea, denominado raquitismo na criança e osteomalacia no adulto”, contou.

    A situação de Larissa é agravada por um fator: sua intolerância ao fósforo deixa o tratamento mais difícil e, ao mesmo tempo, faz com que a busca por respostas e alternativas façam parte da sua vida acadêmica. A falta de fósforo foi, também, responsável pela dificuldade inicial com as rotinas de aulas e de estudos. “Era como se eu não tivesse energia para ficar o dia inteiro na aula e depois ainda estudar”, conta. Hoje, ela tem a carga horária reduzida, mas trabalha arduamente para conquistar seus objetivos.

    Larissa, natural de Palmeira, no interior do Paraná, entrou na faculdade de Medicina pela política de cotas da UFPR, realizando um dos seus sonhos de infância. Filha mais velha, ela sempre contou com o apoio da mãe para estudar – e não conseguia ficar longe da escola, sentia-se entediada. As rotinas de idas e vindas aos hospitais também não atrapalharam sua vida escolar: aluna atenta, tirava boas notas.

    O esporte ajudou a melhorar a qualidade de vida, pois além de jogar bola e andar de bicicleta ela também praticou capoeira. “Na capoeira eu aprendi a me conhecer de verdade, era onde eu percebia que, com determinação e muita vontade, eu poderia fazer tudo o que os outros faziam”.

    Na faculdade, logo se apaixonou pela ortopedia, mesmo que seu desejo inicial fosse trabalhar com neurocirurgia. A passagem pela disciplina de genética também marcou: ali ela percebeu que a forma como o raquitismo era apresentado estava associada a uma visão geral, padronizada, e que de alguma forma poderia contribuir com sua experiência.

    Complexidade da doença motiva paixão pela Medicina

    Já no primeiro ano de faculdade, durante o período de férias, Larissa começou a acompanhar cirurgias ortopédicas. Durante duas semanas, de terça a sexta, ela vivenciou a rotina de um centro cirúrgico sem estar na condição de paciente.“Eu pude assistir a cirurgias pelas quais eu mesma já havia passado e isso mudou muito do que eu sabia até então”, relatou. Depois, começou a frequentar o ambulatório e, ali, começou a descobrir que seu problema não envolvia somente a questão óssea, mas também a angulação do joelho.

    Não é só a raridade da XLH que faz com que a doença desperte o interesse de Larissa – o fato de envolver diferentes especialidades, como nefrologista (especialista no funcionamento dos rins), endocrinologista e ortopedista, também fez com que se aproximasse de diversos professores e médicos. “Comecei a pesquisar os currículos de médicos das especialidades ligadas ao osso, para entender cada vez mais o osteometabolismo”, conta.

    Agora, Larissa compartilha o que vem estudando em duas páginas nas redes sociais. “Criei essa página para ajudar as outras pessoas com XLH. Vou expor o dia a dia de como é conviver com essa doença rara e trazer posts de dicas de algumas dúvidas frequentes”, registrou, no Instagram. No Facebook, textos didáticos são mesclados com postagens de serviços para portadores de doenças raras, como a divulgação de associações de apoio.

    Para Larissa, ser portadora do XLH ao mesmo tempo em que vivencia uma rotina acadêmica em um curso de Medicina amplia suas potencialidades. “A Medicina é totalmente expandível – e essa expansão pode me capacitar nas doenças raras”, comenta. Apaixonada pela ortopedia, ela tem o sonho de ser uma profissional diferente, justamente por viver com uma doença genética. “Quero ser uma ortopedista diferente. Não tive muita informação e convivi com muitos pacientes que também não tinham. Poder orientar e explicar o que pode amenizar a doença é o que me dá forças para continuar estudando”.