Quando pensamos no mercado da saúde, a primeira ideia que passa em nossa cabeça seria a dicotomia vida versus morte. Sem uma boa saúde, sem tratamento adequado, a morte pode chegar mais cedo tanto para todos nós, quanto para nossos entes queridos e amigos.
Devido a dicotomia acima, temos a questão de que uma saúde bem gerida tem como consequência uma sociedade mais saudável, portanto, mais ativa para trabalhar e contribuir para a sociedade e pagar impostos, que são parcialmente revertidos para a saúde pública. Sendo a saúde um direito universal de todos os cidadãos brasileiros definidos na Constituição Federal de 1988. Entretanto, mesmo com este direito garantido, os governos falharam (sem qualquer conotação ideológica sendo tratada neste artigo).
Grandes escândalos de corrupção em todos os níveis na saúde aconteceram com o passar dos anos. Os investimentos na saúde pública, ano após ano, foi diminuindo. Iniciou-se a prevalência ou quase monopólio das administradoras dos planos de saúde, onde quem tem dinheiro pode ter um atendimento adequado e humanizado.
Surge, então, em 2020, uma pandemia global e aparentemente nosso governo não estava preparado para enfrentar as questões de saúde envolvidas na mesma. Não havia nenhum protocolo de governança para tratar destes casos, que podem ser improváveis, mas a vida demonstrou que acontecem e irão continuar a acontecer mais e mais vezes.
Portanto, se a saúde pública e privada já tivesse implementado Programas de Compliance efetivos não veríamos tantos escândalos na mídia, como aconteceu nos últimos anos. Não gostaria de generalizar, temos excelentes instituições privadas que tem Programas de Compliance de primeiro nível, mas se trata da exceção.
O Programa de Compliance no mercado da saúde nada mais é, do que o cumprimento às leias e aos princípios éticos que regem as boas práticas empresariais, o estímulo à uma cultura de controles internos, possibilitando assim, o entendimento e cumprimento por parte dos operadores, dos requisitos dos órgãos reguladores e fiscalizadores.
O mercado da saúde deve incorporar o Compliance na gestão de todas as suas atividades, desde o consultório médico, até os grandes hospitais, por meio de uma gestão apropriada. Dessa forma, os riscos de Compliance podem ser minimizados ou até extintos, por isso, é interessante que a organização invista na elaboração de um programa de Compliance eficiente. Através do Compliance, caso seja efetivo, há possibilidade de diminuição de possíveis danos à reputação da organização e de seus funcionários, prevenção à cassação da licença da companhia, impedimento de sanções administrativas, pecuniárias e até mesmo criminais.
A prevenção ainda traz o benefício de não despender de gastos com processos judiciais e indenizações. Um dos maiores benefícios de se ter um Programa de Compliance eficiente, consiste na empresa conquistar a admiração e confiança dos clientes, repercutindo em uma boa reputação e no aumento da capacidade de atração de clientes, e com isso, aumento do lucro da organização.
Sabe-se que os desvios de médicos e colaboradores no ramo hospitalar, não são apenas condutas impróprias de uma pessoa isoladamente. Frequentemente a falha advém de problemas sistêmicos e institucionalizados. O programa de Compliance no mercado da saúde deve ser seguido principalmente pela alta administração, que deverá dar o exemplo aos seus subordinados, criando uma nova cultura baseada nos mais altos padrões de ética. Com a identificação dos riscos, cria-se um cenário mais fácil de mitigação dos mesmos, e mais, cria-se meios de provas, para alguma eventual ação, de que a organização preza e age corretamente, podendo argumentar, não há conivência em algum caso isolado de algum desvio no padrão de ética de algum indivíduo isoladamente.
Há um crescimento da implantação do Programa de Compliance no mercado da saúde, principalmente com o advento da Resolução Normativa nº 443, de 25 de janeiro de 2019, da Agência Nacional de Saúde, as operadoras de saúde, tiveram que adotar práticas mínimas de governança corporativa, com ênfase em controles internos e gestão de riscos.
Nessa resolução, há a obrigatoriedade da implementação do programa para empresas de médio e grande porte, enquanto às de pequeno porte, é facultativa. Há também benefício na redução de capital regulatório, através da comprovação ao atendimento de todos os requisitos da regulamentação.
O que se espera para o futuro, é que cada vez mais a saúde pública e privada implemente Programas de Compliance efetivos não porque existe uma obrigação legal, mas devido a vontade de demonstrar para a sociedade transparência, integridade e comprometimento com a vida.
* Waldyr Ceciliano – CEO da True Auditoria, Consultoria e Serviços, especialista em saúde, formado em medicina pela Universidade Federal Fluminense
* Patricia Punder, advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da FIA e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patrícia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).
Leia mais sobre Negócios & Mercado no Saúde Debate, clicando aqui
Leia outros artigos publicados no Saúde Debate