Quando o assunto é o diagnóstico de uma doença oncológica (relacionada a tumores), a defesa bastante proferida por médicos “cada caso é um caso” faz muito sentido. Isso porque a detecção da doença, as causas dela, o tratamento e as terapias mais indicados variam muito e sempre de acordo com as características da doença, histórico médico e genéticas de cada pessoa.
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Graziele Moraes Losso, geneticista e bióloga molecular, especialista em aconselhamento Genético Oncológico*, fala mais sobre como o aconselhamento genético é essencial para a prevenção e o diagnóstico qualificado no tratamento contra o câncer.
O câncer tem cura. Como o uso da tecnologia atualmente torna isso possível?
Graziele Losso – Atualmente já se visualiza o aumento da curva de sobrevida em diversos tipos de cânceres, e até mesmo a cura. Com o avanço do sequenciamento genético (análise do DNA e RNA), juntamente com o desenvolvimento de drogas-alvo baseado em marcadores genéticos tumorais e germinativos, mudou-se o cenário do tratamento e segmento oncológico. Surgindo um novo conceito em tratamento oncológico, chamado de “oncologia personalizada”, em que cada indivíduo é tratado conforme seu perfil genético. Para que haja esta medicina personalizada, existe a necessidade de testes genéticos específicos.
O que são testes genéticos e como eles podem apontar os melhores caminhos para o tratamento do câncer?
GL – Testes genéticos são exames realizados no nosso material genético (DNA ou RNA). Estes exames podem ter dois propósitos diferentes na oncologia personalizada. O primeiro, mencionado anteriormente, quando analisamos o material somático, no caso o tumor, procurando algum marcador genético para uma droga específica. O outro objetivo do teste genético é determinar, a partir da análise do nosso DNA germinativo, se temos maiores riscos e propensões a desenvolver determinadas doenças, como é o caso do câncer. Na oncologia, por exemplo, estes testes são aplicados para compreender o diagnóstico de cânceres hereditários, assim como o risco do surgimento de novos tumores. Os cânceres podem ser esporádicos ou hereditários. Os esporádicos são os mais comuns, causados por fatores epigenéticos (alterações genéticas que sofremos ao longo da vida, provocada pelo meio ambiente). Já os hereditários, são causados por alterações genéticas passadas de uma geração para a outra, e correspondem entre 10% e 15% do total de casos de cânceres.
Então existem síndromes hereditárias de câncer?
GL – Atualmente, existem 50 síndromes de câncer hereditário descritas. Estima-se que cerca de 10% a 15% de todas as neoplasias (tumores) estejam relacionadas a alguma alteração germinativa, portanto, hereditária. Em determinados cânceres, esta taxa pode ser muito maior. Um dos casos mais famosos é o da atriz americana Angelina Jolie, que em 2013 foi identificada com uma mutação patogênica no gene BRCA1, após uma análise em seu DNA. Esta mutação configura a Síndrome – HBOC – Hereditary breast – ovarian cancer syndromes (Câncer de Mama e Ovário Hereditário).
Como posso descobrir se tenho propensão a ter câncer no futuro?
GL – O médico assistente (ginecologista, mastologista, oncologista, urologista) deve encaminhar para uma consulta de aconselhamento genético oncológico.
Mas o que é um aconselhamento genético oncológico?
GL – O aconselhamento genético oncológico é um processo para avaliar e compreender o risco de uma pessoa e seus familiares de terem câncer no futuro. Também nos casos em que a pessoa já está com câncer, pode ser avaliado se tem causa hereditária. O Aconselhamento Genético consiste em duas consultas pré-teste e pós-teste genético com um especialista em genética, onde a primeira consulta (pré-teste) geralmente envolve uma discussão aprofundada sobre seu histórico médico pessoal e familiar envolvendo as últimas três gerações.
Quais informações serão avaliadas?
GL – O conselheiro genético vai montar uma árvore genealógica de câncer (Heredograma) baseado nas seguintes informações: histórico de pessoas da família diagnosticadas com câncer; idade da pessoa no início de qualquer tipo de câncer ocorrido na família; idade atual dos membros vivos da família e a idade dos que falecerem na data do óbito; localização do tumor primário dos cânceres (poderá ser necessária uma cópia do laudo de patologia, se disponível); ou qualquer outra informação relevante sobre a saúde da família.
No aconselhamento genético pode ser solicitado algum tipo de exame específico?
GL – Sim, após avaliar seu heredograma, o conselheiro genético irá conversar com o paciente sobre outras ferramentas que podem explicar o seu risco de câncer, isto pode incluir testes genéticos. Ele também falará sobre os benefícios, riscos, custos e limitações dos testes genéticos.
Quais os benefícios do aconselhamento genético no paciente oncológico?
GL – A informação da hereditariedade no câncer não é importante apenas para o paciente com a síndrome genética, ela pode mudar toda a conduta médica com formas diferentes e mais eficientes de tratamento de sua doença e da prevenção de novos cânceres. Também, diz respeito à família, uma vez que, seus parentes (irmãos, filhos, sobrinhos) podem também ser portadores, com isso o médico pode tomar decisões e condutas profiláticas para toda a família.
Sabia que se estima que cerca de 10 a 18% de todos os tumores estejam relacionados a alguma alteração hereditária?
Em determinados tipos de cânceres, a taxa pode ser ainda maior. Confira dados sobre as incidências:
- Câncer de mama – Sete a cada dez (72%) mulheres portadoras de variantes patogênicas nos genes BRACA1 e BRACA2 são diagnosticadas com câncer de mama. Apesar de ser uma doença mais prevalente em mulheres, variantes em BRCA2 aumentam em até 80 vezes o risco de desenvolver o cancro em homens. Mulheres com mutações nestes genes também têm aumento do risco de câncer de ovário, cólon, pâncreas e melanoma.
- Estima-se que de 5 até 10% dos cânceres de mama sejam explicados por alterações genéticas herdadas. Os genes BRCA1 e 2 explicam 1 a cada 10 destes casos. Adicionalmente a estes dois genes, existem outros genes considerados como genes de alto risco (PALB2, PTEN, TP53, ATM e CDH1) e genes de risco moderado (CHEK2, NBN, NF1 e STK11).
- Câncer de cólon – cerca de 20% dos pacientes com esse tipo de câncer possuem componentes genéticos hereditários;
- Câncer de tireoide – o câncer medular de tireoide, ou CMT, tem componente hereditário em 20% a 25% dos casos;
- Câncer de próstata – a forma hereditária ocorre em 10% a 20% dos casos de câncer de próstata.
*Informações Assessoria de Imprensa