A expressão “letra de médico” é uma forma pejorativa popularmente utilizada para se referir à má caligrafia presente em qualquer texto escrito à mão. Assim, visando dar segurança e tranquilidade aos pacientes/beneficiários e também aos médicos prescritores, tentando evitar ações administrativas (CRM) e até judiciais (cíveis/indenizatórias e/ou criminais) contra os médicos e as Operadoras às quais estão vinculados (cooperados, credenciados, contratados, etc.), em decorrência de erros provocados pela “letra do médico”, que dificulta, ou impossibilita, o entendimento do atendente da farmácia (muitas vezes do próprio farmacêutico), e também do paciente ao não entender as prescrições (dosagem, período, etc.), que podem levar a sérias consequências, às vezes irreparáveis (até à morte), aos pacientes/beneficiários, entendemos ser pertinente esclarecer os profissionais médicos sobre a sua responsabilidade quanto ao assunto.
Ainda, especificamente no Sistema Unimed, importante alertar também quanto ao correto preenchimento das GUIAS DE SOLICITAÇÃO (exames, procedimentos, internações, etc.), que devem conter o(s) descritivo(s) com seu(s) respectivo(s) código(s) e quantidade, de forma clara e atualizada; além do nome do beneficiário, do número do cadastro na Unimed (carteirinha), da assinatura e do carimbo com o nome legível e o número da inscrição no CRM do médico solicitante.
Assim, observamos que o art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil estabelece que: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece, ou melhor, a ninguém é dado desconhecer a lei”; mais claramente: “a ninguém é dado o direito de desconhecer o Direito”. O mesmo é válido, naturalmente, para os médicos que têm a obrigação de conhecer profundamente o “Código de Ética” da sua profissão. O Art. 29 do “Código de Ética Médica”, aliás, é taxativo quando estabelece como norma: É vedado ao médico: Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência“. (grifo nosso).
A Lei nº 5.991, de 17 de Dezembro de 1975, se referindo ao problema em questão, diz no seu Art. 35: “Somente será aviada a receita: a) que estiver escrita a tinta, em vernáculo, por extenso e de modo legível; b) que contiver o nome do paciente e, expressamente, o modo de usar a medicação; c) que contiver a data e assinatura do profissional e o número de inscrição no respectivo Conselho Profissional. A resolução da Anvisa RDC nº 67, de 08 de outubro de 2007, autoriza o farmacêutico a avaliar a receita pelos critérios de legibilidade antes de aviá-la, podendo barrá-la pelos riscos que uma interpretação errônea pode causar.
Ainda, o “Código de Ética Médica”, no seu capítulo III, da Responsabilidade Profissional, preceitua: É vedado ao médico: … Art. 39 – Receitar ou atestar de forma secreta ou ilegível, assim como assinar em branco folhas de receituário, laudos, atestados ou quaisquer outros documentos médicos. Receitar de forma ilegível, portanto, é prática que estabelece um ilícito ético. “É uma negligência, e como redigir uma receita é ato médico, caracteriza a modalidade culposa se resultar em dano ao paciente”.
O Conselho Regional de Medicina do Paraná, aliás, já emitiu diversos entendimentos sobre o assunto, como o Parecer 2017/2008, que ressalta: “todos os dados da prescrição deverão estar preenchidos corretamente pelo profissional, pois as farmácias não estão autorizadas a aviar receitas incompletas ou mal preenchidas”. No Brasil não encontramos dados estatísticos sobre o assunto; porém, de acordo com um levantamento feito pela National Academies of Science’s Institute of Medicine (IOM), nos Estados Unidos, a má escrita dos médicos mata mais de 7.000 pessoas e erros médicos preveníveis causam danos a mais de 1,5 milhão de pessoas anualmente. Muitos destes erros resultam de abreviações e indicações de dosagem mal escritas e da escrita ilegível em algumas das 3,2 bilhões de prescrições escritas anualmente naquele país.
Os profissionais médicos devem ficar atentos ao assunto, atualizando o controle e a emissão de documentos. A ilegibilidade dos documentos médicos é um problema que tende a se tornar cada vez menor com o emprego dos meios eletrônicos de registro de histórico médico (prontuário eletrônico) e de prescrição de medicamentos, procedimentos, etc., uma vez que a migração do papel e caneta para plataformas eletrônicas será inevitável. Esses são pontos cruciais para ajudar a melhorar a qualidade no atendimento médico, proteger o prescritor, aumentar a segurança do paciente, obter um melhor desfecho clínico, aprimorar a gestão de recursos financeiros e trazer o paciente para o centro do cuidado.
Mauro Cezar Abati é Gerente de Assuntos Jurídicos da Unimed Paraná