O mercado brasileiro de saúde suplementar vem sendo muito discutido, ele atingiu a marca recorde de 50,6 milhões de beneficiários, mas em meio ao aumento de sinistralidade, fraudes, desperdício, judicialização e incorporação de novas tecnologias ele encontra o desafio de se manter sustentável, ou seja, equilibrar a receita e as despesas.
Entre os temas que estão sendo mais debatidos estão a qualidade do atendimento, acesso, foco no paciente e a sustentabilidade do setor. E foi para discutir esses e outros assuntos que cerca de duas mil pessoas participaram do Congresso Internacional UNIDAS 2023. Em sua 26° edição, o evento já se consolidou como um dos principais (e mais esperados do ano) do universo da saúde suplementar. O Centro de Convenções Salvador, na capital baiana, foi protagonista de uma série de debates e encontros para discutir temas relevantes para o setor no Brasil.
Com o tema “Reinventar o modelo de saúde suplementar para um sistema sustentável e mais inclusivo”, o evento contou com 73 palestrantes, em 34 painéis e workshops. “É muito importante reunir diferentes atores do ecossistema para discutir as estratégias da sustentabilidade da saúde suplementar e das autogestões, que estão sendo impactadas por fatores como o aumento na sinistralidade, a flexibilização do rol de procedimentos e os novos tratamentos de alto custo incorporados ao rol”, destaca Anderson Mendes, presidente da UNIDAS. Confira como foi cada dia do Congresso e os principais destaques.
Primeiro dia
O Congresso Internacional UNIDAS começou oficialmente com a apresentação da Pracatum Escola de Música e Tecnologias, associação social sem fins lucrativos com programas educacionais, culturais e de desenvolvimento para a comunidade, idealizada pelo artista Carlinhos Brown.
Em seguida, Cláudia Rebelo, head of Commercial Relationships da CUF, moderou a palestra Os desafios para universalidade, equidade e sustentabilidade na saúde, um olhar para o público e privado, de Adalberto Campos Fernandes, professor da ENSP NOVA (Escola Nacional de Saúde Pública) e ex-ministro da Saúde de Portugal. O professor traçou um panorama da saúde global com os maiores desafios aos países e às organizações de saúde, bem como as oportunidades de evolução que são proporcionadas pela inovação e pelo desenvolvimento tecnológico.
Segundo o docente, “no Brasil o desafio é incorporar novas tecnologias e medicamentos pouco sustentáveis. Nenhum país do mundo consegue vencer a equidade sem envolver o Estado. A prevenção é essencial para prolongar os anos de vida saudáveis da população e, a atenção primária é essencial para controlar o aumento da sinistralidade, que interfere e muito na sustentabilidade do setor”.
Quais os cenários futuros da saúde suplementar no Brasil? foi o tema da conferência magna de abertura, que contou com a participação de Paulo Rebello, diretor-presidente da ANS; Renato Casarotti, presidente da Abramge; Manoel Peres, presidente da FENASAÚDE; Flaviano Feu Ventorim, vice-presidente da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB). Anderson Mendes, presidente da UNIDAS, foi o moderador. Peres destacou a importância de focar na sustentabilidade do setor. “Atualmente temos um crescimento exponencial das fraudes, queda da taxa de natalidade e avanço do sinistro. E, todo esse cenário pode interferir no número de pessoas que terão acesso à saúde a longo prazo.” Casarotti destacou a importância da atenção primária na saúde com um todo. “É preciso ter acompanhamento mais próximo com pacientes crônicos, gestantes e a melhor idade. Esse cuidado impacta não só saúde, mas o financeiro. A tecnologia aqui tem papel importante, mas nem por isso podemos largar a mão das pessoas. Desenhar esse elo é fundamental, precisamos usar a tecnologia a nosso favor.” Anderson Mendes presidente da UNIDAS destacou que ambulatório não é atenção primária.
Já Paulo Rebello reforçou que o setor de saúde não poderá evitar a incorporação da tecnologia de forma ampla – e que as inovações vieram para ficar. “As mudanças estão batendo na porta, já sabemos os desafios estruturais. Nesse contexto, precisamos de um poder legislativo e judiciário atuantes. Temos um setor complexo, que envolve diversas áreas do conhecimento e é preciso ter a sociedade no centro”. Sobre verticalização, Peres diz que não acredita nesse sistema. “Temos um grande território demográfico e isso pode sucatear a saúde porque limita liberdade de escolha e não impacta necessariamente redução de custos”. Flaviano Feu Ventorim também destacou que o cliente precisa entender que ele também paga a conta no uso equivocado dos planos, gerando um custo desnecessário que interfere no regime de mutualismo. “O beneficiário só lembra quando impacta na vida e no bolso. É preciso que ele entenda o processo e as consequências.”
A parte da tarde começou com a palestra: A visão do contratante sobre as operadoras de saúde no Brasil. Mediada por Geórgia Antony Gomes de Matos, consultora de negócios no Serviço Social da Indústria – Departamento Nacional, Maurício Nunes, diretor de desenvolvimento setorial da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS); teve Luciana Correa Dalcanale, diretora de Previdência e Saúde na Vivest; e do Rodrigo Filus, head Plano de Saúde, Segurança do Trabalho, Ergonomia e Saúde Corporativa na Volkswagen do Brasil foram os palestrantes. Enquanto Luciana destacou que há uma barreira cultural em relação à promoção de saúde. “Os usuários não entendem a importância dela para a saúde a longo prazo mesmo já tendo ferramentas para auxiliar”, disse. Já Rodrigo comentou que há muitas oportunidades, mas algumas esbarram na questão regulatória, e que o essencial é focar no desfecho clínico. “Quem paga tudo, no fim, são os contratantes”, pontua Nunes.
Iniciativas do CNJ para reduzir a Judicialização à Saúde foi o tema abordado por Richard Kim, conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e por Alexandre Quintino Santiago, desembargador coordenador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, tendo Daniel Tostes, procurador da ANS como moderador. Na opinião de Daniel, o setor da saúde suplementar está em um momento desafiador com muitos acertos a serem feitos. Já Alexandre entrou na seara dos impactos contratuais para as autogestões. Segundo ele, há obrigações que fazem com que as autogestões precisem atender e custear os atendimentos e que nem sempre estão formalizados contratualmente. “É preciso investir nas conciliações para evitar as judicializações que estão crescendo”, diz Richard.
Guilherme Velloso Leão, presidente do Instituto de Certificação Institucional e dos Profissionais de Seguridade Social (ICSS) fez a o lançamento da Certificação Profissional UNIDAS, com apoio do Instituto de Certificação Institucional e dos Profissionais de Seguridade Social (ICSS), que terá início em janeiro/2024. Cinco gestores foram certificados: Anderson Ferreira (ênfase Administração e Finanças); Anderson Antônio Monteiro Mendes, Cleudes Cerqueira de Freitas, José Antônio Diniz de Oliveira e Regina de Arruda Mello Blanco (ênfase Gestão de Saúde e Operação).
Já a tão esperada apresentação dos trabalhos ganhadores do Prêmio UNIDAS teve a presença de José Antonio Diniz de Oliveira, presidente da FIOSAÚDE e presidente do Conselheiro Deliberativo na UNIDAS. Os ganhadores na categoria não filiadas foram Patrícia Santos, ASQ SAÚDE (3º lugar), Bruno Limas da QUALIREDE (2º lugar) e professor Antônio Neto da UNIFESP (1º lugar). Entre as filiadas, Regina Celi da FUNDAFFEMG, Juliana Busch e João Paulo do Reis Neto da CAPESESP e Carleuza de Lima da EVIDA, na ordem do primeiro ao terceiro lugar.
Segundo dia
Ana Maria Malik, professora titular da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas); Eliane Medeiros, diretora de Fiscalização da ANS (Agência Nacional de Saúde); e Larissa Eloi, CEO do Sindhosp (Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo), debateram sobre as Conexões estratégicas para a sustentabilidade da saúde suplementar, com moderação da Denise Eloi, CEO no Instituto Coalizão Saúde. “O setor suplementar precisa pensar no beneficiário como centro afinal, queremos que ele seja saudável. A saúde suplementar é uma cadeia de valor é por isso que há tanta reclamação, o mercado precisa ver as regras com atenção. Se antes, sustentabilidade era focada no social e econômico, com o passar do tempo veio a economia ecológica. Hoje, falamos muito em desenvolvimento sustentável e, precisamos diminuir a assimetria das informações e fazer conexões. Na saúde temos que gastar melhor, analisar os padrões de custos sustentáveis e a equidade da sustentabilidade”, diz Ana Maria Malik. Eliane destacou a importância de a população ter acesso à informação e se sentir aberta ao diálogo com o órgão regulador para diminuir a judicialização e aumentar a satisfação do beneficiário.
A palestra Avanços e desafios da inovação em saúde teve Josier Vilar, presidente da Iniciativa FIS (Ecossistema de Lideranças e Empresas de Saúde da LATAM) e presidente da ACRJ (Associação Comercial do Rio de Janeiro) como moderador e, Jacson Barros, gerente de Desenvolvimento de Negócios de Saúde na AWS (Amazon Web Services) e Rogério Boros, Co-Fundador & CTO da PicDoc Teleconsultas, como convidados. Jacson frisou a importância do conhecimento sobre os termos novos que muitas vezes não são usados como deveriam. “A jornada do paciente não começa e termina na consulta. Os determinantes sociais que fazem parte cada vez mais não estão na pauta. Ninguém pergunta quanto tempo a pessoa demorou para chegar na consulta, se tem uma alimentação balanceada e noites de sono tranquilas.” Josier ressaltou que os custos com responsabilidade social podem reduzir os custos tanto do setor público quanto do privado. Já Boros citou que a transformação de saúde impacta em todo sistema e é preciso avaliar se os dados estão sendo usados e analisados da melhor maneira possível.
Na parte da tarde do Congresso, o painel Quais os desfechos em saúde colhemos no Brasil?, teve a participação do médico Alexandre Fioranelli, diretor de Normas e Habilitação dos Produtos da ANS, e moderação do Breno Duarte, diretor do Grupo IAG Saúde e da plataforma Valor Saúde Brasil by DRG Brasil + Inteligência Artificial. Breno começou destacando que, nos últimos 12 meses, cerca de 40% de diárias consumidas poderiam ter sido evitadas pelo aprimoramento dos aspectos de regulação em saúde e, esse número corresponde a mais de 3 milhões de diárias de desperdiçadas no sistema de saúde. Já Fioranelli comentou que a saúde hoje apresenta algumas crises relacionadas ao valor (que envolve o desperdício) e o crescimento insustentável de custos. “Precisamos discutir o modelo de remuneração que só envolve gastos e custos. É preciso discutir o desfecho valor, mesmo porque há uma diversidade enorme de atores do sistema e da cadeia.”
Carla de Figueiredo Soares, diretora adjunta de Normas e Habilitação dos Produtos da ANS; Mariana Tonetto, diretora clínica da Genial Care debateram os Desafios e oportunidades: reflexão sobre os desafios enfrentados na prestação de cuidados de saúde para indivíduos com TEA sob moderação de Marina Shizuko Andrade Yasuda, gerente na Amagis Saúde e Diretora Técnica na UNIDAS. Nessa palestra foi debatido se os prestadores estão habilitados a diagnosticar os indivíduos com TEA (transtorno do espectro autista) e como precificá-los já que a condição com estereótipo dificulta o diagnóstico que na maioria das vezes é tardio.
Na sequência, foi debatido o Ativismo Judicial na Área da Saúde com a palestra do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão, do desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia Mário Albiani Júnior e moderação de José Luiz Toro, assessor jurídico da UNIDAS. “O ativismo judicial traz repercussões para toda a sociedade, principalmente diante das novas leis que alteraram a lógica da taxatividade do rol da ANS. As decisões judiciais podem comprometer a sustentabilidade das autogestões, sendo um tema, portanto, da máxima importância”, comenta Toro. Já Salomão destacou que a judicialização continua ascendendo nos últimos cinco anos e que é necessário um treinamento para aprender a lidar com a tecnologia que caminha a passos largos.
O tema ACO: como este modelo de organização pode auxiliar na solução dos problemas dos sistemas de saúde teve como debatedora Vilma Dias, especialista em Atenção Primária à Saúde e em Gestão de Planos de Saúde e, diretora na Vitalie Saúde. Ainda sobre o tema, o médico Robert Janett, líder de saúde populacional da ACO na Cambridge Health Alliance e professor assistente de Medicina na Harvard Medical School, abordou o atual sistema de atendimento fragmentado e o pagamento de taxa por serviço que resultou em aumentos rápidos e de custos sem melhorar suficientemente a qualidade ou a eficiência do atendimento no Saúde Suplementar. “É preciso focar no paciente que está na sua cadeira, na sua responsabilidade sobre a saúde da população e engajar a população nos cuidados necessários para uma vida com saúde e vitalidade”. Jorge Aquino, diretor de Normas e Habilitação das Operadoras da ANS, foi o moderador.
Terceiro dia
No terceiro dia do Congresso, o perfil do executivo de saúde do futuro foi abordado por Carmen Ribeiro, diretora de mercado na DR. Online; Marilea Souza, presidente do Colégio Brasileiro de Executivos em Saúde – Chapter Bahia; Francis Albert Fujii, médico executivo; e Tacyra Oliveira Valois Nery, CEO do CBEXs (Colégio Brasileiro de Executivos em Saúde) foi a moderadora. Marilea lembrou que que mudar a cultura do setor de saúde leva um tempo e que, ter acesso ao conhecimento não significa que mudança de comportamento. É preciso ter educação e conhecimento em saúde. Já Tacyra destacou que ser protagonista da transformação exige um equilíbrio muito grande, e trazer a governança clínica para essa mudança é essencial. Carmen ressaltou que o sistema de saúde tem dados disponíveis que poderiam auxiliar nessa jornada. “Nós, enquanto líderes, precisamos incentivar e apoiar nossa equipe. Lidamos com várias gerações e com vários perfis, desde aqueles que ainda não sabem lidar com digital até quem nasceu neste novo mundo.”
Já a palestra especial A presença da inteligência artificial nas artes do século XXI teve a presença do comunicador e educador Marcelo Tas, e do músico, apresentador e produtor musical João Marcello Bôscoli. Com moderação de Anderson Mendes, presidente da UNIDAS, foram abordados os impactos das transformações do mundo digital, das novas tecnologias e da inteligência artificial nas relações humanas, nas pessoas e no mundo dos negócios.
O encerramento e a entrega do Troféu InovaSaúde UNIDAS – Prêmio para Startups aos três primeiros colocados foi feito por Cleudes Freitas, vice-presidente da UNIDAS e diretor administrativo financeiro da Associação dos Servidores Fiscais do Estado da Bahia. Os ganhadores foram Genial Care, Cass e Prontmed.
Com informações da Unidas