Adoro metáforas. Nos ajudam a entender, com exemplos práticos e conhecidos, os objetivos que buscamos, sozinhos ou em conjunto com outras pessoas.
A busca pela Luz é uma constante em toda nossa existência. Começa ao sair pelo canal do parto, primeira luz, começo de uma jornada independente, como uma conquista da humanidade em produzir mais um indivíduo a perpetuar a espécie.
Mas é também o começo de um imenso aprendizado, da transformação da luz difusa e confusa em um progressivo reconhecimento de rostos, movimentos, sons e frases. Das incompreensíveis até as mais significativas. Frases que formam o conhecimento. Conhecimento que faz a ciência. Ciência que ilumina decisões e que cria mais luz.
Aprendizados que possibilitam discernir entre o fazer e o desistir. Entre aprofundar relacionamentos ou nem considerá-los. Entre crer no abstrato ou manter-se profano. Entre o bruto e o polido.
Mais que a dualidade da escolha entre onde estou e pra onde vou, está o caminho. Ou o túnel. Metaforicamente a construção que leva para a luz, que está no final. Mas é o final mesmo?
Objetivamente: a construção do caminho, depois da primeira “iluminação” é uma sucessão de outros caminhos, construídos a cada movimento respiratório, a cada ato ou omissão, a cada contato humano, na natureza livre ou na construção humana, a cada livro lido, a cada curso feito, a cada participação ou elaboração de um processo de trabalho, enfim, a cada fantástico momento que a vida nos possibilita viver.
Mesmo a doença que nos limita por um lado, nos ensina por outro e nos faz procurar e encontrar uma saída. Muito se fala de luz nas doenças ou traumas graves, quando ela simboliza uma perda, uma passagem do material para o espiritual, para o etéreo. É confortante e até necessário que o instinto de preservação como espécie, que rege subliminarmente nosso viver, acolha a percepção da luz que significa nascimento, como sendo a mesma luz que significa despedida final.
Nos conforta a possibilidade da continuidade em outro plano. Mas nossa aceitação é diretamente proporcional à construção do túnel que fizemos para nós ou para quem amamos ou com quem nos importamos de fato.
Com que material construímos o túnel? Que fundações ou que concreto usamos? Fizemos um projeto bem estruturado ou simplesmente fizemos o túnel? Executamos o projeto ou ele está simplesmente enrolado e guardado em um tubo de papelão junto com tantos outros?
Emblemática ou não, a mudança de ano, especialmente de um ano em que diuturnamente fomos bombardeados pela ameaça constante de uma doença parcialmente desconhecida, de um assaltante invisível à maioria de nós, que nos rouba a paz, a saúde e até milhões de vidas, esta mudança traz muito mais que a troca de calendário. Traz a reflexão sobre nossos túneis e as luzes que esperamos encontrar, no começo, no meio e no final deles.
Vacina pode ser uma luz, mas não será a única. Mudança de comportamento será também uma luz que já começa a brilhar com intensidade, mas que ainda precisa ter o túnel reforçado.
Uma nova reflexão sobre nossa vida pessoal, mas também sobre o senso de viver em coletividade, tão próprio da espécie. Um sentido de proteção coletiva que ainda não aflorou como deveria frente a essa ameaça atual, mas frente a tantas outras que já incorporamos, e que estão causando rachaduras profundas no túnel da vida social.
Embora filosófico, o pensamento que precisamos refazer ao longo do caminho, é uma percepção que, tenho absoluta certeza, compartilho com todos aqueles que querem e que constroem, DE FATO, uma sociedade mais honesta consigo mesma e com seus objetivos. E o fazem no dia a dia das suas vidas, dos seus relacionamentos, nas frases que dizem e nas ações não verbais que executam.
Graças ao poder do túnel da comunicação, que torna todas as regiões habitadas do planeta uma única nação, podemos conviver e compartilhar conhecimento.
Se a luz do meu conhecimento não for suficiente para iluminar todo o planeta (o que acontece para muitos iluminadores historicamente consagrados) talvez eu e você consigamos iluminar o caminho dos mais próximos e junto com eles iluminar o caminho dos não tão próximos, e assim, sucessivamente reconheçamos que nós somos os túneis e que a luz não está no final, mas na energia que nos impele a fazer o caminho correta e coletivamente. Pense nisso e não deixe de fazer o seu papel.
Leia aqui outras colunas de Marlus Volney de Morais
Conheça mais sobre as colunas do Saúde Debate