Nos últimos tempos temos ouvido muito falar sobre morte. Mais do que comumente.
Depois que a pandemia se instalou é uma das palavras que mais ouvimos, na mídia, redes sociais, conversas paralelas, em pequenos grupos, em casa, no noticiário em geral.
O avanço da pandemia é feito pela contabilização das mortes. A cada dia, um novo número. No município, no estado, no país, no mundo.
O maior temor: a morte!
E quando ela se impõe veementemente, impõe-nos também a necessidade de falar sobre ela, mais do que nunca.
Há tempos não ouvimos falar de tantas mortes ocorrendo massivamente. As últimas notícias datam do século passado, em situações similares de pandemia e atrocidades acometidas pelo homem.
Evitamos a todo custo falar sobre a morte. Esse assunto ainda é tabu em nossa sociedade, mas diante de situações como a que vivenciamos ela se impõe.
E contrariamente do que se espera – falar dela com naturalidade – como algo que faz parte do ciclo vital, quando ela vem de forma tão avassaladora parece que é banalizada. É esse o cuidado que temos que tomar.
A morte não é para ser nem banalizada, nem esquecida. Quando falamos de morte falamos de vida, pois uma não existe sem a outra. Uma está contida na outra.
Vivenciamos mais tempo com a vida, a morte é um instante que dela faz parte.
Por mais que tentemos negar e evitar, cedo ou tarde vivenciaremos sua chegada. E não é o fato de estarmos falando dela que faz com que ela se avizinhe com maior rapidez, como muitos pensam.
Vivenciamos pequenas mortes no nosso dia a dia. As perdas fazem parte do nosso cotidiano, da nossa trajetória de vida. Células morrem no nosso corpo todos os dias, dando lugar a outras para continuar a manutenção da nossa fisiologia. Perdemos empregos, relações terminam, mudanças bruscas de local de trabalho ou moradia, dentre outras transformações e rompimentos. Não são estes fatos pequenas mortes? Representações de finitudes? Afinal nada é eterno em nossa existência.
A morte ainda é encarada como inimiga, algo a ser temido e combatido, principalmente na área da saúde entre alguns profissionais da área, que em sua formação acadêmica, muitas vezes são treinados muito para curar e pouco para cuidar. E o momento da morte se encaixa nesse último processo. A morte é para ser cuidada, acolhida, assim como aqueles que a vivenciam.
Falar e refletir sobre a morte é algo tão pluralístico. Há tantas possibilidades de leitura e significados, tamanha é a riqueza nesse campo que é parte constituinte do humano, que aliás, dentre todas as espécies é o único ser que tem consciência da sua morte. A religião, a sociologia, a biologia, a psicologia, a antropologia, o jornalismo, o direito, a filosofia, a história, a medicina, a bioética, se pedíssemos a cada um desses saberes um breve refletir sobre essa temática, teríamos um belíssimo diálogo. Porque a morte está contida em todas essas áreas e é entendida e pensada por diferentes pontos de vista.
Vale lembrar que ela já passou por várias transformações como bem nos coloca o historiador francês Philippe Ariès em sua obra História da Morte no Ocidente: da Idade Média aos nossos dias.
Não há aqui a intenção de romantizar a morte, tampouco tratá-la com leviandade, afinal, ao contrário do que muitos desejam, ela pode ser muito sofrida, dolorosa e difícil.
O intuito é que possamos trazer o tema para reflexão, falar sobre esse momento que chegará para todos nós, sem qualquer distinção.
Para finalizar deixo uma frase de Picasso, que muito me toca e me faz refletir…
A morte não é a maior perda da vida. A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos.
(Pablo Picasso)
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