Com o advento das tecnologias, muito da nossa vida cotidiana tem se transformado nos últimos tempos.
Nossa forma de nos relacionarmos afetivamente não é a mesma, temos uma gama de alternativas que facilita a aproximação de pessoas com alguma afinidade conosco.
Para nos relacionarmos socialmente e em família, também temos dispositivos a nossa disposição. Em fração de segundos transmitimos uma ideia, perguntamos algo, damos uma noticia, fazemos um comunicado, organizamos um encontro, compartilhamos uma piada.
Nosso trabalho então, que vem sofrendo transformações desde a revolução industrial, quem dirá agora tempos em que até processos seletivos acontecem online e vídeo conferências são realizadas de uma parte do mundo à outra.
Nossa alimentação também. Sofre transformações desde o momento em que a matéria prima de muitos produtos é colhida no campo. Para chegarem até nossa mesa, muitos alimentos passam por variados processos. Tudo com ajuda de muita tecnologia.
E o que dizer da forma como hoje solicitamos comida em casa? Tempos atrás só tínhamos os famosos “disk pizza”. Hoje basta um aparelho smartphone com aplicativos destinados a esse fim para pedirmos o que a fome e a vontade mandarem.
E nosso lazer, também sofreu transformações? Muitas.
Desde o cinema 8 milímetros, o inesquecível vídeo game “Atari”, até os filmes em 6D. Jogos de altíssima tecnologia disputam a atenção dos jovens e adultos fascinados por jogos eletrônicos e online. Quanta transformação!
E na educação? Houve transformação com o avanço das tecnologias? Sim, incontáveis.
Houve a época em que vendedores batiam de casa em casa vendendo a famosa enciclopédia Barsa. Muitos hoje nem ouviram falar nessa enciclopédia que já foi importante para muitos estudantes. E não era muita barata, os pais que podiam compravam-na e parcelavam em várias vezes para que seus filhos tivessem uma mini biblioteca em casa.
Hoje, em poucos minutos fazemos a pesquisa que desejarmos num simples dedilhar de teclas e o famoso dr. Google responde muitas de nossas questões.
E a área da saúde? Será que também passa por processos de transformação? Inegáveis!
Além do conhecimento e informação que temos hoje a nossa disposição para que tenhamos uma melhor qualidade de vida e com isso cuidemos melhor de nossa saúde, temos os avanços da medicina que a cada dia nos mostra uma descoberta diferente, visando melhor manutenção e cuidado com a saúde. Vacinas e novos tratamentos vão surgindo frente às variadas necessidades do nosso tempo.
Isso sem mencionar os avanços, também proporcionados pela tecnologia, no campo da farmacologia e da robótica.
Esses são apenas alguns poucos exemplos das mudanças ocorridas nas últimas décadas e que trazem pra nós uma nova forma de ver e vivenciar as situações.
Mas, e o processo de luto? Será que também é impactado por tantos processos tecnológicos que temos vivenciado?
Sim!!!!
Por mais subjetivo, único, pessoal e particular que seja, o processo de elaboração de um luto não está imune às interferências dos processos tecnológicos.
Mas como??
Começando pela forma como lidamos quando um ente querido, um amigo ou colega de trabalho, está em processo de adoecimento, terminalidade ou mesmo em processo de fim de vida.
Antigamente fazíamos mais visitas, telefonávamos. Hoje basta ter um contato de uma pessoa em comum ou fazermos parte de um grupo de aplicativo de mensagens instantâneas para que tenhamos notícias imediatas de como está a situação.
E quando o óbito acontece?
Em outros tempos o comunicado era feito através de algumas poucas ligações e a notícia de espalhava boca a boca. Hoje também, porém com a ajuda dos aplicativos de mensagens e das redes sociais.
Logo, as redes sociais e o ambiente virtual passaram a ocupar um lugar de notícias e expressão dos sentimentos, após a morte de uma pessoa querida.
E continua depois de um tempo até que dor primeira amenize um pouco.
Além disso, com os avanços tecnológicos até mesmo os rituais fúnebres passam por modificação. Vejamos alguns exemplos:
· Velórios online: câmeras são instaladas e a transmissão é feita para quem mora distante e não pôde comparecer ao funeral.
· Comunicação via aplicativo de mensagens: funerárias se encarregam de fazer o comunicado de todas as informações, local, horário do velório e enterro, e se a família desejar até uma mensagem de agradecimento posterior.
· QR Code em lápides: contendo identificação, foto e todo histórico da pessoa que ali está enterrada.
· Velas virtuais: evitando acúmulo de velas acessas nos cemitérios, elas queimam numa página da internet e duram o tempo que a pessoa desejar.
· Enterro ecológico: cremações são feitas em temperaturas mais baixas reduzindo emissão de gás carbônico. Há também cápsulas que se decompõem no solo e até uma espécie de compostagem que acelera a decomposição do corpo e utiliza caixões biodegradáveis.
· Sistemas de localização: Hoje já existem programas que oferecem “mapas” das sepulturas de forma online, permitindo que as pessoas consultem a localização exata em seu próprio smartphone.
Quanta mudança!
Duas sociólogas da Universidade de Washington (EUA) estudaram a maneira como os usuários interagem nas redes sociais com os perfis de pessoas que já morreram.
A pesquisa realizada analisou as conversas e o comportamento de pessoas diante da morte, nas plataformas Twitter e Facebook e perceberam que nesses aspectos as plataformas tinham um propósito diferente quando se trata da morte de alguém.
Observaram que no twitter usuários que nem conheciam a pessoa que havia morrido discutiam, debatiam, canonizavam ou até condenavam o falecido.
Já no facebook o espaço serve para compartilhar a dor de maneira mais íntima com mensagens mais profundas assim como forma de apoio a quem perdeu um ente querido. Assim o facebook é entendido como uma espécie de prolongamento do âmbito privado onde podemos expressar nossos sentimentos como expressamos à pessoas mais próximas.
Em todas as culturas sempre existiram tradições sobre a morte, mas no século XX e no mundo ocidental, os ritos foram relegados ao interior das casas e às funerárias. “O luto era algo que se sofria na intimidade. As redes sociais em geral reverteram isso e trouxeram novamente a morte ao âmbito público”, explica uma das pesquisadoras.
Também é possível encontrarmos na internet sites que se destinam a criar um histórico, uma espécie de memorial de quem já morreu. O próprio facebook oferece a possibilidade de se criar uma conta em homenagem a usuários que já faleceram.
A internet passa a ocupar então um espaço de demonstração de sentimento após a morte de uma pessoa querida.
Parece que no mundo virtual há mais permissão para se falar da dor da perda e maior reconhecimento dessa dor.
Por quê?
Será porquê no mundo real não encontramos ainda espaço e naturalidade para falar sobre a morte e sobre o processo de luto? Morte e luto são ainda assuntos proibidos.
O alívio da dor da perda acontece nesses vários ambientes, real e virtual, compartilhar o luto faz parte da elaboração desse processo. Apesar de todo apoio encontrado nas redes sociais, nada substitui a escuta empática e presencial, um toque, um abraço afetuoso e acolhedor.
E nesse período de festas onde o processo de luto pode intensificar a dor de quem vivencia uma perda, o acolhimento e espaço para expressão dos sentimentos é o que conta bastante.
A disponibilidade para ouvir alguém em processo de luto, sem julgamentos, faz muita diferença para quem passa por esse momento de sofrimento. Lembrando que o processo de luto é individual, cada pessoa vai vivenciá-lo de forma diferente.
Muitas vezes não sabemos o que dizer. Palavras nesse momento não conseguem aliviar ou amenizar a dor. Uma presença sincera, generosa e cordial já é o bastante.