Lighthouse

Antes tarde que mais tarde … e o relato sobre nossa aventura na Ilha do Mel, finalmente, saiu do forno; porque não importa a intempestividade da narrativa, mas, a riqueza dos detalhes. E graças a uma das maiores invenções da humanidade (sempre imaginada, mas, nunca concretizada), pegaremos uma carona de ré, na máquina do tempo, até o mês de novembro do ano de 2020… e cá estamos!

 

Depois de muitos meses de planejamento, em um ano bastante incomum, conseguimos visitar a doce e encantadora Ilha do Mel, no litoral paranaense. No princípio, a dificuldade era definir a data, prevendo qual seria o melhor final de semana, pois a instabilidade climática daquela primavera nos desafiava.

 

La Niña, com seu típico temperamento instável, mais uma vez, fazia estragos no Paraná. Porém, a sorte mudou, bons ventos sopraram, e na primeira semana de novembro, após consultar diariamente os sites de previsão do tempo, escolhemos o Dia D e a Hora H: teríamos apenas 36 horas para desfrutar e explorar os encantos daquela pequena porção de terra cercada de água por todos os lados.

 

Fizemos a reserva da hospedagem: residência familiar, com 3 quartos e demais dependências compartilhadas. Ótimo preço, boa localização e excelente atendimento do anfitrião. Tudo isso nos deixou muito motivados e na expectativa de aproveitar o tempo intensamente na ilha. Hospedagem, pedágio, estacionamento, combustível, alimentação, despesas extras … tudo minuciosamente calculado.

Uma viagem de baixo custo para a Ilha do Mel é possível, se planejada com alguma antecedência. E foi assim que juntamente com minha fiel escudeira, nosso cachorro e um casal de amigos que mal havia desembarcado em Curitiba retornando de Recife, ocupamos nossos assentos, às 6 horas da manhã do sábado, afivelamos os cintos e partimos rumo a Pontal do Paraná, depois de uma curta noite de sono… “noites mal dormidas, dias bem vividos!”

 

Viagem tranquila, via BR-277, 116 km percorridos e, duas horas depois, o sol já refletia nas agitadas águas do litoral paranaense. Não gosto de correr (nem na estrada, nem na vida); já vivemos apressados demais. Quem anda de carona comigo sabe disso. Ando devagar. Além disso, o trecho Curitiba – Paranaguá é lindo demais, vale à pena ir com calma e apreciar a paisagem.

 

A diversão começou quando nos aproximamos da área dos estacionamentos em Pontal do Sul. Fomos abordados pelos “agentes” de determinado estacionamento e nem tivemos a chance de escolher um estacionamento mais perto dos trapiches de embarque para a ilha. Só não fomos tirados do carro à força porque as portas estavam trancadas.rs Mas o preço de duas diárias ficou interessante e precisávamos ganhar tempo, então deixamos o carro lá mesmo.

 

Guardamos nossas bagagens no porta-malas da van, embarcamos e nos dirigimos para o local onde pegaríamos a famosa barca para a Ilha do Mel. Nossa intenção inicial era pegar a barca oficial, da Abaline, a R$ 35 por pessoa, porém, o agente do estacionamento sorrateiramente nos deixou no pátio de uma das empresas de taxi náutico, parceira do estacionamento e foi embora. Detalhe: foi embora com nossas bagagens no porta-malas da van. Só nos demos conta disso depois de pagar o valor do táxi náutico (R$ 50 por pessoa), um serviço um pouco melhor que a barca da Abaline, mais privativo, digamos assim.

 

Achamos o serviço desorganizado, mas não desanimamos. Bagagens restituídas, embarcamos rumo a Encantadas, a parte mais movimentada da Ilha. Em questão de 20 minutos, aportamos no trapiche, às 8h30. A ilha ainda estava acordando. A promessa de um final de semana ensolarado atraiu centenas de turistas para o litoral. Loucura, loucura!

 

O receptivo da hospedagem nos encontrou e fomos conduzidos até o local onde ficamos instalados por dois dias. Uma casa simples, agradável, espaçosa e com água tratada. Ficamos os 4 e o cão no mesmo quarto, afinal, nossa intenção era curtir os atrativos da ilha ao máximo e dormir só o necessário.

 

O cão, batizado de “Cuscuz”, com seu habitual entusiasmo quando se trata de passear, parecia mais empolgado que nós. Ele realmente é um cão aventureiro. Antes de completar 1 ano, já contabilizava mais de 1.000 km rodados nas estradas paranaenses. Na ilha, enquanto nos ajeitávamos para uma foto em família, em cima de uma pequena ponte, ele, cuidadosamente colocado em cima do corrimão, resolveu se jogar para o outro lado, para fora da ponte, preso ao meu braço pela guia da coleira, o que quase resultou numa amputação sem anestesia.

 

Nossa sorte é que a mãe dele tem um reflexo excelente, e se jogou logo atrás, para salvá-lo! Temos vídeos e fotos do episódio para provar.kkk Depois de nos recuperar do susto, rimos muito.

Bem, voltando ao relato, depois de deixarmos as bagagens na acomodação, resolvemos curtir o lado manso da praia de Encantadas e suas suaves marolas. Como ainda não haviam muitas pessoas na ilha, pudemos contemplar a paisagem sem lutar por um espaço na areia e descansar da viagem. Que paz!

 

Nos sentamos em frente ao mar, com dezenas de montanhas ao fundo, água cristalina, transparente, céu azul, sol abundante. Tudo isso causou muita admiração em nossos convidados. Segundo eles, que já estiveram em Jericoacoara, no Ceará, a Ilha do Mel é um dos lugares mais bonitos que já conheceram; compararam inclusive com Arraial do Cabo/RJ e Maragogi/AL. Confesso que este feedback me causou espanto e um certo orgulho, pois essa joia da natureza está situada no Paraná. Realmente, a ilha está muito bem conservada, suas ruas limpas e com uma boa estrutura hoteleira e gastronômica que agrada a todos. A vibe do lugar é incrível!

 

Após esse momento de recriação e recreação, retornamos para a hospedagem onde fizemos nosso próprio almoço, coisa de trilheiro, e nos preparamos para explorar o outro lado da ilha – Brasília.

 

Como nosso horário estava apertado, utilizamos novamente o serviço de táxi náutico – R$ 15 por pessoa. Nossa intenção era conhecer a Fortaleza e o Farol da Conchas, porém, como o caminho até a Fortaleza que, segundo informações, levaria em média 40 minutos, no nosso ritmo levou mais de uma hora e, somado ao retorno para a “base”, mais de duas horas de caminhada. Com isso, o Farol ficou para uma próxima visita à Ilha.

 

A caminhada até a Fortaleza foi pela orla; uma ampla extensão de areia branca e fina. Há quem faça o trajeto em bicicleta, o que representa uma significativa economia de tempo. Recomendo e pretendo experimentar um dia.

 

Depois de algumas pausas para fotografias vídeos, ao nos aproximarmos da fortaleza, avistamos um pequeno farol no meio do mar. Enquanto os demais faziam fotos, eu admirava o farol.

 

Tenho um certo interesse por faróis e pelo que representam. Faróis salvam a vida de marinheiros e salvam a embarcação dos arrecifes e outros perigos no mar; eles indicam o caminho. Em inglês, são chamados de lighthouses; tema de lindas poesias e canções.

 

Realmente, histórias sobre faróis e marinheiros sempre me causam admiração. Inclusive, enquanto admirava o farol, uma  imensa barbatana, de tonalidade marrom, surgiu através da água e logo desapareceu, no meio do mar. Fiquei por um tempo esperando que aparecesse novamente, almejando ver também o seu proprietário, uma sereia, quem sabe …

 

Subimos até a fortaleza, onde vimos antigos canhões apontados para o horizonte e algumas guaritas estreitas com vista para o oceano. Alguns navios distantes me reportaram para cenas de grandes produções que retrataram as invasões marítimas do tempo em que o mundo era uma terra sem lei e sem dono, ciente de que aquele lugar já foi cenário de disputas e batalhas. Fizemos algumas fotos prá registrar. 2 casais soltos no mundo, exploradores, aventureiros, curtindo a viagem, a companhia. Que privilégio!

 

Feito isto, nos apressamos para voltar a tempo de pegar a lancha que nos levaria de novo para Encantadas. Força de tartaruga! O sol escaldante e a dor na sola dos pés quase nos fizeram perder o último táxi. Mas voltamos a tempo de embarcar. Inclusive, quem atrasou, foi a lancha. No retorno, algumas cabeças pendiam ao sabor das ondas, sonolentas, depois de um dia incrível.

 

Retornamos para a hospedagem, tomamos um banho revigorante e fomos jantar na orla. Encontramos um buffet por R$ 35, à vontade, onde fizemos valer nosso dinheiro… comemos como se não houvesse amanhã!!! E ainda levamos um champanhe pra comemorar o aniversário da Maria (Nossa desculpa caso questionassem nossa entrada no restaurante com uma bebida. Obviamente, nós comemoramos o aniversário da Maria sem a presença da Maria, mas esse detalhe, conforme combinamos, só seria revelado se nos questionassem). E assim, brindamos à vida, aos amigos e à natureza, ao som da alegre música caiçara. E sobrevivemos à barraca do pagode logo ao lado. Diga-se de passagem, o gosto musical do povo da ilha é bem eclético, tem pra todos os gostos!

 

Após a bela refeição, retornamos para a hospedagem para descansar um pouco, para acordar dispostos no dia seguinte, pois a agenda seria um pouco apertada, considerando que seria nosso último dia na ilha.

Assim foi. Acordamos cedo, tomamos nosso café e nos dirigimos para a gruta de Encantadas. Cerca de 20 minutos de caminhada, passando entre as hospedagens e casas dos moradores da ilha; casas coloridas, alegres, bonitinhas. Moraria lá fácil. Parece até uma vila cenográfica.

A entrada da Gruta é acessível através de um tablado de madeira com corrimão, mas, pelo que observamos, muitos preferem se arriscar pelas pedras. Assim, presenciamos algumas cenas inusitadas, de pessoas sendo surpreendidas pelas ondas e literalmente arrastadas pela água. Algumas havaianas recuperadas, gritos, correria, alvoroço total para resgatar os turistas desavisados. Se sóbrio não é uma boa ideia tentar essa façanha, muito menos depois de umas latinhas de cerveja e ainda mais com a latinha de cerveja na mão. Ou você salva as havaianas, ou você salva a bebida, e, com isso, constatamos que muita gente voltaria para casa sem os chinelos aquela tarde. Sacou?

 

Depois de presenciarmos duas vezes cenas como esta, com um certo temor, chegou a nossa vez de visitar o interior da gruta, mas fomos pelo método tradicional, pelo tablado.rs Fizemos algumas fotos rápidas, sob ameaça da maré subir e dificultar a saída da gruta, mas valeu à pena a experiência, todos ficaram satisfeitos … eu acho.

 

Feito isto, fizemos uma breve pausa para fotos em frente ao bravo mar daquele lado da ilha, brincamos um pouco com nosso cãozinho e então retornamos para a acomodação, para comer o nosso último angú. Retornamos mais uma vez para a beira da praia, onde as águas são mansas, e ali pudemos apreciar as últimas horas da nossa aventura, entre conversas aleatórias e um rolê de caiaque, alugado por R$ 30 a hora. Aos poucos, o sol foi baixando e, cientes de que a última barca retornava às 18h para Pontal, voltamos para a acomodação para o último banho antes de nos despedirmos da ilha.

 

Mochilas devidamente arrumadas, nos dirigimos para o trapiche, onde teria continuidade nossa aventura. E que despedida meus amigos! Dezenas de pessoas brotavam no trapiche, ansiosos por uma vaga na próxima barca. Resumo: confusão e empurra-empurra no embarque. E enquanto o trapiche balançava de um lado para o outro, um certo mal-estar e medo daquilo tudo desabar dentro do mar conosco em cima. Foi muito gratificante quando identificamos nosso “táxi” e conseguimos embarcar.

 

O mar estava agitado mas, aos solavancos, chegamos do lado de lá e embarcamos na van que nos levaria até o carro, que nos levaria para casa. Tudo lindo, exceto pelo engarrafamento de duas horas que pegamos na saída de Pontal do Paraná e nos forçou a desviar do fluxo até uma lanchonete próxima, onde forramos o estômago com o delicioso e generoso sanduíche do Raulzito e aguardamos até que o fluxo de veículos na rodovia suavizasse para podermos retomar a nossa viagem rumo a Curitiba.



Chegamos em casa por volta das 24h, só o fiapo do osso, mas, satisfeitos e agradecidos porque tudo correu bem e finalmente tivemos a oportunidade de viver a vida da ilha e sentir a energia maravilhosa daquele lugar.

 

Em breve, quem sabe em 2021, voltaremos para explorar Brasília e seus encantos, do outro lado da ilha. Enquanto esse dia não chega, vamos nos entretendo entre uma trilha e outra, e acompanhando a saga “Lost” no streaming; aquele seriado de televisão gravado em uma ilha qualquer … no Havaí! Fui ali e já volto …

Leia outros artigos de Cris Pereira aqui.

Conheça também os demais colunistas do portal Saúde Debate. Acesse aqui.