|Altitude: 1877,392 m (6158,14 pés) |
Em tempos de home office e distanciamento, valorizo ainda mais tudo o que me mantém conectado à natureza.
Na parede à minha frente, em um canto da sala que virou escritório, logo acima no notebook que utilizo para escrever meus relatos, olho para um encantador retrato de um entardecer no Everest, ou Sagarmāthā, como é chamado no Nepal. O ponto culminante da Cordilheira dos Himalaias. O teto do mundo. O destino mais cobiçado por alpinistas do mundo inteiro em seus 8.846.86 m de altitude acima do nível do mar.
Tivesse o privilégio de visitar o Nepal ou o Tibete, me contentaria em passar dias observando-o, de longe.
Muitos aspiraram ver o mundo lá de cima. Tentaram, mas não tiveram a sorte de voltar para casa. Outros, entretanto, lograram tal feito e chegaram ao topo da montanha mais alta do planeta, mas voltaram dela profundamente modificados.
Dizem que cada um terá a vista da montanha que escalar, mas, nem todas as montanhas são para todos os montanhistas e o Everest é para os raros.
Uma coisa é certa: as montanhas são sempre imprevisíveis e desafiadoras.
Lá em cima não há estabilidade climática. O tempo pode mudar de uma hora para outra e ninguém, por mais experiente que seja, deseja ser apanhado por uma ventania ou tempestade no alto da montanha.
De acordo com os registros históricos, há cerca de 80 anos, no inverno de 1941, alguns jovens exploradores caminharam durante muitos dias pela mata fechada, abrindo picadas e enfrentando as condições mais desfavoráveis possíveis, com o objetivo de identificar uma cadeia de montanhas vista ao norte da cadeia do Marumbi. Acreditava-se tratar da região mais proeminente do Paraná. Uma expedição na serra do mar paranaense, coordenada por Reinhard Maack, explorador e geólogo alemão que viveu boa parte da vida em terras brasileiras, tendo fixado residência na cidade de Curitiba, onde lecionou como professor da UFPR.
Foi assim que, no dia 13 de julho daquele ano, o Pico do Paraná foi conquistado pela primeira vez e, após isto, oficialmente reconhecido como ponto culminante do Paraná e região sul do Brasil.
Os relatos afirmam que a BR-116 surgiu muitos anos depois de tal façanha, o que torna o feito ainda mais interessante.
Minha primeira ascensão ao Pico do Paraná aconteceu muitas décadas depois, em condições de acesso infinitamente melhores, em meados de 2008. Um grupo animado de nove “calouros” que acordaram num domingo qualquer e decidiram subir a montanha mais alta do Sul do Brasil, de ataque.
Seis horas depois de iniciarmos a trilha, chegamos ao cume com o tempo muito fechado, frio e chuvoso e um misto de frustração e alegria.
Tivemos que nos contentar com nossa própria companhia e apenas imaginar como seria ver algo lá de cima. Assim, a trip não foi completamente um sucesso, mas rendeu boas amizades e um certo orgulho pela conquista.
A fotógrafa que nos acompanhou, carregando seu equipamento fotográfico menos compacto que alguns mais modernos, dois dias depois da trip, relatou em suas redes sociais: “A montanha é uma pedra com um pauzinho no meio”. E essa frase foi eternizada, criticada por vários montanhistas e até hoje rende boas risadas.
Alguns anos depois, a saudade me fez querer voltar e a segunda ascensão finalmente aconteceu.
Tinha tudo para ser outra tentativa frustrada de pegar uma janela para o Ibitiraquire, considerando a instabilidade climática desde o Getúlio.
Desta vez, um grupo menor: dois sobreviventes da primeira ascensão, o Andreas e eu. Mas agora não éramos mais tão “calouros” assim. Já tínhamos adquirido alguma experiência explorando outros cumes.
Estávamos outra vez no cume do Pico do Paraná, exaustos e nos preparando mentalmente para o retorno.
Tudo em volta de nós estava oculto por nuvens densas, escuras. Paciência, é “o risco do negócio”.
Alguns minutos para recuperar o fôlego e firmar as pernas antes de iniciar a descida e, inesperadamente, um vento suave começou a soprar. Quando nos demos conta, a paisagem ao redor do cume começou a se revelar e, em pouco tempo, fomos finalmente apresentados à Serra do Ibitiraquire. Como comemoramos este momento!
A janela se fechou rapidamente, mas rendeu boas fotos de nossa façanha. O sorriso, de orelha a orelha.
Às vezes parece que a montanha quer nos testar. E não só fomos testados física e psicologicamente pelo PP, mas, aprovados e presenteados por ele, a montanha mais alta do sul do Brasil.
Deste singelo feito, nunca irei esquecer. E pretendo voltar, em breve. Quem sabe em 2021!
Muitos anos antes de me aventurar nas trilhas, meu amor pelas montanhas já era absurdo. Um verso bíblico sempre me transportava lá para cima: “Elevo os meus olhos para os montes. De onde me virá o socorro?”
Uma das lições que a montanha ensina fala sobre coragem e perseverança, sobre superar obstáculos e acreditar que sempre haverá algum tipo de recompensa. No final das contas, ir e voltar vivo talvez seja a maior das recompensas. No mais, o que vier é bônus!
Esta atividade, quando realizada com planejamento e segurança, traz benefícios incontáveis à saúde. E está aí, para quem tiver coragem e aceitar o chamado da montanha.
Algumas recomendações antes de sair explorando as montanhas por aí:
– Invista em um bom calçado, de preferência, uma bota, que oferece estabilidade extra em terrenos irregulares;
– Alimente-se adequadamente e tenha certeza de estar mental e fisicamente descansado antes de iniciar uma ascensão;
– Leve água suficiente para manter-se hidratado;
– Respeite seus limites e os avisos da montanha;
– Não vá sozinho e, de preferência, deixe alguém avisado.
Dicas simples e necessárias para sobreviver e voltar, sempre que sentir saudade.
Registro da 1ª ascensão, 2008: A neblina impede de ver toda a animação da galera no cume do “nosso” gigante (ele é paranaense!!!). \o/
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*Cris Pereira é graduada em Psicologia pela Universidade Tuiuti do Paraná e atua na área de regulação dos planos privados de saúde desde 2002. É praticante frequente de trekking de aventura há quase três décadas, além de amante de viagens, natureza e fotografia. Neste espaço, compartilha dicas, relatos e impressões de suas aventuras.
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