Em nosso sangue, temos células como os glóbulos vermelhos, que contêm hemoglobina, responsável por transportar oxigênio aos tecidos. Quando o número de glóbulos vermelhos diminui, a hemoglobina também é reduzida; ou seja, acontece o que chamamos de anemia. Nessa situação, os tecidos sofrem. Dependendo do nível da hemoglobina, podem até ocorrer lesões graves (infarto do miocárdio, por exemplo).
O sangue contém outros tipos de células, dentre elas, as plaquetas. Elas fazem a primeira parte da nossa coagulação. A falta delas – que pode ocorrer em leucemias, após quimioterapias e transplantes – leva a sangramentos, que podem ser graves (cérebro, pulmões etc.).
Além das células, nosso sangue contém várias proteínas, incluindo os fatores de coagulação, que se juntam às plaquetas para evitar sangramentos. Algumas doenças (hepáticas) levam o paciente a ter sangramentos pela falta desses fatores (quase todos produzidos pelo fígado). Essa situação acontece com frequência, também, em traumas graves, pois ocorre um consumo exagerado dos fatores de coagulação, levando à sua falta e, consequentemente, a sangramentos graves.
Precisamos do sangue e de seus componentes para transfusões em inúmeras situações: o atendimento a traumas, em grandes cirurgias e nos transplantes de órgãos sólidos e de medula óssea. Além disso, eles são essenciais para pacientes submetidos a quimioterapias ou portadores de doenças nas quais há uma menor produção – ou perda – de sangue.
Até o momento, não há substitutos para o sangue humano. Podemos utilizar, por exemplo, um fator de crescimento de células, como a eritropoetina, que aumenta a produção de glóbulos vermelhos pela medula óssea. Porém, isso leva de 15 a 20 dias – claro, se a medula óssea for normal. Isto é, ele não seria útil em hemorragias agudas ou em situações de doenças da medula óssea (leucemias, aplasias, pós-quimioterapias, entre outras).
A única forma de atendermos a essa demanda da medicina moderna é contando com a doação de sangue por pessoas que entendem essa necessidade. Por isso, explicá-la para toda a população é muito importante.
Trata-se de criar uma cultura de doação de sangue em nosso país, da mesma forma como fizeram os Estados Unidos e várias nações europeias, por exemplo. Nestes casos, isso se deve aos seus envolvimentos em guerras e grandes catástrofes. Em alguns desses países, o número de doações por ano atinge cerca de 10% da população. No Brasil, ainda estamos em, aproximadamente, 1,5% a 2%. Mas a boa notícia é que tem havido um grande incremento de doadores voluntários, mostrando que estamos no caminho certo.
O processo é muito simples. O doador deve ter entre 16 e 69 anos e estar em boas condições de saúde. Os homens podem doar quatro vezes por ano, com intervalos mínimos de dois meses. Já no caso das mulheres, a frequência é de três vezes por ano, com intervalos de três meses, uma vez que elas têm um menor estoque de ferro no organismo.
O doador deve levar um documento com foto. Ele passará por uma pré-triagem: avaliação da pressão arterial, pulso, temperatura e peso, além de teste de anemia. Se estiver tudo dentro dos parâmetros da normalidade, ele seguirá para a entrevista.
As questões envolvem problemas cardíacos, neurológicos, pulmonares, entre outros, para proteção do próprio doador. Além disso, as perguntas sobre doenças transmissíveis (aids, hepatite, chagas, malária, gripe, infecções bacterianas etc.) servem para proteger o paciente que receberá o sangue.
Aprovado na entrevista, o voluntário seguirá para a doação propriamente dita. É feita uma punção na veia antecubital (entre o braço e o antebraço) e é coletado um volume de, no máximo, 13% do que temos de sangue no corpo. É sabido que esse volume, que gira em torno de 400 a 450 ml, não causa problemas para nós. Tomar dois copos d’água ou suco após a doação já reconstitui nosso volume sanguíneo instantaneamente. A coleta do sangue dura de cinco a dez minutos e todo o processo, cerca de 40 minutos.
São coletados alguns tubos da própria bolsa para realização de testes de tipagem ABO-Rh e de sorologias (chagas, sífilis, HIV, HTLVI/II e hepatites B e C). Havendo alguma alteração, o doador é chamado para repeti-los e fazer testes mais precisos (confirmatórios), pois podem ocorrer falsos positivos (no caso, o teste se mostra positivo por alguma interferência, mas o doador não tem nada de anormal).
O sangue coletado é submetido a uma centrifugação, que separa as células do plasma. Assim, são obtidos os hemocomponentes: hemácias, plaquetas, plasma e crioprecipitado. Os dois últimos são utilizados para a reposição de fatores de coagulação. Esses hemocomponentes obtidos são distribuídos para os hospitais e, lá, ficam armazenados até seu uso em pacientes.
Vimos, acima, que o sangue é importantíssimo e que a sua disponibilidade depende de todos nós. Doar é muito fácil e não nos oferece riscos. Faz parte de uma “obrigação” solidária do ser humano.
Devemos fazer doações, assim como tentar convencer e estimular outras pessoas a fazerem o mesmo. Parabéns àqueles que já fazem dessa atitude parte da sua vida! A data de 25 de novembro é o dia de homenagearmos esses cidadãos brasileiros.
Procure o hemocentro ou hemonúcleo mais próximo para doar ou agendar sua doação.
* Prof. Dr. Marcelo Gil Cliquet é médico hematologista, coordenador da Área de Hematologia e Hemoterapia da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUC-SP – campus Sorocaba, doutor em Hematologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e fellow do American College of Physicians (FACP).
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