Por paradoxal que seja, Amazonas, o “pulmão do mundo” ficou sem oxigênio. E agora o país do pulmão do mundo também.
Até conseguimos produzir e engarrafar O2 medicinal. Mas precisamos distribuí-lo e rápido. O dano que a mutante Manaus (ou Brasileira ou P1) e o próprio SarsCov 2 causa, rouba do pulmão dos contaminados sintomáticos o mais necessário dos gases à nossa sobrevivência. Asfixia metabólica que não só causa a percepção angustiante de “falta de ar”, mas gera desequilíbrio químico que impede resposta adequada do organismo e o leva à falência parcial ou, em quase metade dos casos que vão a UTI, à falência total.
Com mais velocidade e mais agressividade, o vírus agora surpreende e afeta também os mais jovens.
E, em que pesem todas as advertências, faltou educação, senso de coletividade e planejamento.
A educação e o entendimento do papel coletivo, que deveria vir do nosso entendimento íntimo, foram transferidos para a legislação e estão sendo agora reprimidos pela Polícia que tenta coibir abusos “à mão pesada”. A falta da educação pessoal e coletiva de muitos se deve à falta de liderança. Da liderança pública e da liderança no seio familiar. Do exemplo e da hierarquia de pais e irmãos mais velhos, que orientam os mais jovens e coíbem abusos dos arroubos irresponsáveis.
Para explicar muitos comportamentos que vemos hoje, prefiro não falar de educação, porque se esta houvesse, não veríamos nem os absurdos de comportamentos afrontadores mas também de negligências e descuidos que estão nos levando ao caos atual. A liderança a que me refiro é a que podemos exercer nos nossos grupos de relacionamento. Que não deve ser terceirizada como infelizmente, a maioria dos brasileiros teima em fazer.
Para o momento atual, sugiro e peço: Assuma a liderança preventiva no momento em que identificar uma transgressão clara às atuais regras da pandemia. Não se esquive da responsabilidade individual, familiar ou coletiva. Para cada pessoa que se evite contaminar, pelo menos mais uma será protegida e assim criamos a onda de não contaminados que deve desafogar o sistema de saúde, inclusive para outras doenças e inclusive para você que não vai gostar da sensação de asfixia que a COVID-19 traz.
Está muito claro também que faltou planejamento para arrumar o sistema de saúde para essa crise prevista. Como sempre, corremos bastante agora para tentar resolver um problema que poderia ser minimizado antes. Falta-nos a cultura da prevenção, da mitigação do risco. Certamente, não teríamos evitado todas as necessidades a tempo, porque não só o vírus é novo, mas também o conhecimento sobre ele ainda está em desenvolvimento. Mas, pela falta de planejamento e preparo especializado, nossos profissionais, extremamente dedicados e competentes estão entrando em colapso. Colapso psicológico e físico.
Hoje, cabe, na maioria das vezes ao profissional responsável, o dilema que é escolher quem priorizar para ser atendido. Imagine-se o que essa escolha causa ao decisor. Há critérios técnicos, baseados em sistemas de classificação que apoiam a decisão, mas, em todos os casos trata-se de vida humana, de uma história, de uma família, de uma necessidade que provoca sofrimento. Nossa estrutura física e de equipamentos ainda responde, mas às custas de um desgaste por esperas e de um acréscimo de sofrimento e “incursões respiratórias” adicionais que poderiam ser evitadas com planejamento. O paciente entra em colapso e a família também. A sociedade, com medo, se conforma e a desesperança brota.
Não podemos esperar para conter o avanço. Ele precisa parar HOJE. Para aqueles que tem a consciência social, a recomendação é PROTEJA-SE. Assim, protegerá a outros. Fique em casa o máximo de tempo que puder ou fique distante de possível contaminação. Se não puder ficar em casa, distancie-se o máximo possível e use máscara; e não fale com (e muito menos cumprimente) pessoas que estão sem máscara. Mesmo que seja em ambiente aberto. Se estiver contaminado isole tudo que possa transmitir o inimigo.
Seja responsável e cuidadoso com tudo que você toca. Higienize frequentemente mãos e objetos principalmente os que vão ao rosto: celular, talheres, copos, xicaras, lenços e a própria máscara.
Lembre-se: ser educado hoje é cuidar do próximo, mesmo que você não o abrace ou o toque com as mãos, estejam elas espalmadas ou fechadas.
Ainda há tempo para desenvolver a liderança e a educação que está nos faltando como sociedade. De preferência sem polícia e sem política perniciosa.
A vida vale mais que o momento da festa, ou do prazer, ou do “selinho”. As festas, encontros, cerimônias e reuniões podem sim ser adiados em favor da vida. O que é inadiável é a vaga na UTI ou a necessidade de um respirador que consiga imprimir pressão suficiente para que o oxigênio chegue aos pulmões e deles para as células que vão receber e viver a vida que virá.
Com educação, comportamento adequado e planejamento não faltará oxigênio.
* Marlus Volney de Morais é presidente em exercício do Sindicato dos Médicos no Estado do Paraná (Simepar)