“Num futuro próximo, não terá como escapar do lockdown”, diz epidemiologista

Recordes diários de mortes. Taxas de ocupação de UTI que mostram a proximidade ou o próprio colapso do sistema de saúde. O cenário da pandemia de Covid-19 em março de 2021 é pior do que quando os primeiros casos da doença foram registrados, há um ano. Mesmo com o anúncio de medidas restritivas por parte de governos estaduais e municípios, especialistas defendem o lockdown, ou seja, a suspensão quase completa das atividades. “Num futuro próximo, não terá como escapar do lockdown”, diz o médico infectologista e epidemiologista Bruno Scarpellini, do Rio de Janeiro, em entrevista ao portal Saúde Debate

De acordo com ele, mesmo após um ano, uma boa parcela da população ainda tem dificuldade com as medidas básicas de prevenção à Covid-19, ou seja, usar a máscara de proteção, manter distanciamento social e evitar aglomerações. Por isso, há necessidade de adotar providências para reduzir a circulação das pessoas. 

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“As pessoas têm dificuldade de aderir às medidas básicas, seja lá no início, seja cronicamente. É como se o brasileiro tivesse acabado com a pandemia, sem que ela tivesse terminado”, avalia Scarpellini. “Quando há ocupação acima de 70% nos leitos de UTI e variantes que parecem ter maior carga viral e maior transmissibilidade, há necessidade de tomar medidas não farmacológicas mais intensas para diminuir a circulação das pessoas, já que elas não conseguem por livre e espontânea vontade diminuir a circulação”, explica. 

O toque de recolher é uma dessas medidas, inclusive anunciada por alguns estados e municípios brasileiros nas últimas semanas. “Esta é uma tentativa de restringir em um horário em que as pessoas iriam para bares e restaurantes. Mas a medida mais extrema é o lockdown e nunca tivemos isso no Brasil. Acredito que acabará tendo que, num futuro próximo, entrar num lockdown”, opina. 

De acordo com ele, até o momento, as medidas estabelecidas no país foram de isolamento horizontal. Mas não houve exatamente um lockdown, o que representaria uma suspensão ampla de serviços e atividades, além da restrição efetiva na circulação de pessoas. Scarpellini cita como exemplo Portugal, que estipulou que ninguém poderia fazer longo deslocamento dentro da própria cidade sem apresentar justificativa, entre outras ações.

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p class=”ql-align-center”>Médico infectologista e epidemiologista Bruno Scarpellini (Foto: Divulgação)

Como o lockdown ajudaria neste momento?

Para Scarpellini, o lockdown ajudaria a frear o crescimento no número de casos em função da circulação restrita. Além disso, seria a oportunidade para acelerar a vacinação contra Covid-19 na população brasileira. “O correto nesse momento seria impor um lockdown no país por dois a três meses e, nesse período, vacinar 24 horas por dia, sete dias de semana. Mas, para isso acontecer, precisa de um número grande de doses”, afirma.

O médico comenta que é necessário acelerar a vacinação no país. Para ele, houve uma série de erros que culminou em um efeito dominó na pandemia de Covid-19 no Brasil. “Se estivéssemos em janeiro, com vacinas na mão e planejamento, a gente poderia ter feito lockdown em Manaus e vacinar toda Manaus. E agora fazer lockdown no país e vacinar o país inteiro”, indica.

Scarpellini considera que a aposta em apenas duas vacinas para a imunização e a falta de negociação em blocos deixaram o Brasil dependente de produtos internacionais, o que impacta na velocidade de vacinação. “Demorou-se em fazer um plano nacional de imunização, que só foi feito por pressão popular e política. Foi uma série de erros que nos levou a esse momento”, ressalta.

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O epidemiologista classifica o atual estágio da pandemia como diferente de um ano atrás. Ele explica que o avanço da pandemia em 2020 seguiu um padrão dos vírus respiratórios, de março a setembro no hemisfério sul, com uma sequência de Norte a Sul do país, e posteriormente o Centro-oeste. “Agora, o que temos como consequência do período de festas e férias é uma pandemia em várias regiões, com sistema de saúde no limite máximo, com recordes diários de mortes e números de casos”, aponta. Scarpellini diz que ainda não é possível determinar o “peso” nas novas variantes do coronavírus no atual estágio da pandemia no país. 

De qualquer forma, o médico não acredita em um “alívio” nos próximos meses. “O pior da pandemia veremos neste trimestre se continuar nesse ritmo, se continuar com esse número de óbitos. Se se mantiver desta forma, até o meio do ano serão meio milhão de mortes e o número se aproxima às previsões pelo Imperial College de Londres, que todo mundo achou um absurdo. Se continuar no ritmo que estamos, é isso o que vai acontecer”, alerta.

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