A discussão em torno da proposta de Reforma Tributária, em tramitação no Congresso Nacional, também mobiliza a área da saúde. A Associação Médica Brasileira (AMB), por exemplo, se posicionou contra o atual projeto, que poderia acarretar em aumento nos encargos tributários. Conforme a entidade, a área da saúde será impactada pela Reforma Tributária de forma bastante dura, pelo menos com as proposições apresentadas até o momento.
O presidente da AMB, César Eduardo Fernandes, se mostrou bastante preocupado. Ele explica que boa parte dos médicos utiliza Pessoas Jurídicas para firmar contratos com as operadoras de saúde ou mesmo para prestar serviços particulares a pacientes.
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Essa se tornou uma saída para pagar menos encargos na comparação com a Pessoa Física. Mas esses impostos existem e são calculados nos custos de cada médico. “A Pessoa Física é extremamente penalizada. Quando se dá um recibo, isso é feito por meio de uma Pessoa Jurídica porque há menos encargos tributários, dependendo do montante faturado”, esclarece.
Segundo Fernandes, a atual proposta da Reforma Tributária pode triplicar as alíquotas de alguns impostos. Ele dá como exemplo o PIS/Cofins, que ficaria em torno de 12,5%. “Isso vai impactar fortemente o custo do trabalho do médico, que ainda tem outros gastos, como infraestrutura, insumos e funcionários. O médico não terá outra saída a não ser aumentar esse custo. Isso acaba caindo no colo do consumidor”, avalia.
Tiago Lázaro, CEO da Mitfokus, empresa que apresenta soluções financeiras e tecnológicas para a área médica, estima que 85% dos médicos serão impactados com as atuais propostas para a Reforma Tributária, caso ela seja aprovada. Isso porque a maioria desses profissionais trabalha atualmente com Pessoa Jurídica.
Sobre como a área da saúde será impactada pela Reforma Tributária, Lázaro explica que o novo pacote propõe a tributação de dividendos como forma de reduzir a carga tributária das empresas. A proposta reduz a alíquota de 15% para 10% de IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica). Contudo, não altera a alíquota da CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido) e tributa os dividendos em 20%. Isso criaria uma distorção.
“Em termos gerais, a redução da carga tributária em alíquotas efetivas de uma empresa médica no regime do lucro presumido, com faturamento de 100 mil, ISS de 5%, e considerando que os sócios distribuem 60% da receita, diminuiria 1,6% da carga efetiva, tributando em 15,93% aproximadamente. E considerando a tributação dos dividendos, a carga tributária total (empresa + sócio), aumentaria para 27,93% se esta medida fosse colocada em prática. Desta forma, os médicos seriam duramente impactados com a nova forma de tributação, já que suas retiradas são feitas justamente dos lucros de seus negócios”, exemplifica.
Além disso, hoje os dividendos são isentos de tributos. Isso acontece para evitar a dupla tributação, afinal, as empresas já pagam imposto sobre o lucro. E o lucro líquido, que dá origem à distribuição dos dividendos, é justamente a consequência dessa linhagem de tributos, segundo o especialista. “Então, a nova proposta faz com que ocorra a bitributação, sendo que o lucro da empresa já é tributado e o dividendo tem um caráter distributivo”, afirma Lázaro.
Mudanças
Prevendo como a área da saúde será impactada pela Reforma Tributária, a AMB pede alteração na atual proposta. A entidade divulgou uma carta aberta ao presidente Jair Bolsonaro e também ao ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o tema. No documento, a entidade enfatiza que a Reforma Tributária é necessária, mas que ela deve resultar em “justiça econômica”.
A carta traz que a Reforma Tributária “deve ser inteiramente revista quanto aos dividendos para as atividades médicas, sejam as que excedem 20 mil/mês, sejam as do regime de lucro presumido. Da forma como é ofertada à sociedade, traz tão somente mais aumento de impostos e incertezas tributárias”.
Para a AMB, além dos impactos aos pacientes, esse possível crescimento nos encargos deve provocar o encerramento de várias empresas, impactando os empregos na área da saúde. “Em momentos difíceis, como o que atravessamos agora com a Covid-19, estamos na linha de frente, mesmo expondo nossas vidas e de nossos familiares. Não queremos privilégios, mas exigimos respeito e justiça. Não admitimos desfeitas ou traições. O que nos entregam hoje, com a atual reforma, é o aumento de mais de 100% para os serviços médicos, punindo a população com inevitável repasse e inviabilizando a qualidade e a dedicação às quais a sociedade tem direito”, indica a carta.
O presidente da AMB, César Eduardo Fernandes, garante que não há interesse por parte dos médicos em aumentar custos em função do aumento dos encargos tributários. Mas, dependendo do que acontecer com a Reforma Tributária, não existiria outra alternativa. “E vemos isso como um grande problema. Estamos realmente preocupados”, sinaliza.
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